Agressões ao Planeta

Especial
Florestas de proveta

Nem tudo está perdido no Brasil verde:
um terço do consumo anual de madeira
já vem de florestas plantadas, em
que as empresas investem bilhões


Carlos Rydlewski


Fotos divulgação
gação
O artifício do verde: clima favorável e técnicas de clonagem fazem do sul da Bahia uma das áreas mais produtivas do mundo no plantio de florestas

NESTA EDIÇÃO
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O desperdício das águas
Os cenários apocalípticos
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Pagando para ver o desastre
As florestas de proveta

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Na lista de previsões que não resistiram à realidade, podem ser incluídas todas as especulações sobre uma eventual queda no comércio mundial de papel, provocada pela difusão de tecnologias digitais. Isso porque, ao menos por enquanto, o que se vê é o contrário. Em vez de inibir, os meios eletrônicos parecem estimular o consumo desse produto, cuja primeira versão surgiu na China, no ano 105. Entre 1990 e 2004, a fabricação mundial de papel, cuja matéria-prima, a celulose, é extraída de árvores, avançou de 240 milhões de toneladas para 337 milhões de toneladas. Um crescimento de 40%. No Brasil, o salto foi de quase 80% no mesmo período, passando de 4,7 milhões de toneladas para 8,4 milhões de toneladas. E foi por meio de um subterfúgio, o plantio de florestas artificiais, que a indústria do setor bancou esse avanço na produção, sem levar ao colapso as reservas verdes do planeta. No mundo, essas áreas de matas plantadas pelo homem para uso industrial já ocupam 187,5 milhões de hectares, o equivalente a um país do tamanho do México. Dessa gleba global gigantesca, 5,4 milhões de hectares, ou 2,9% do total, estão no Brasil. E, hoje, o país vive um novo ciclo de investimentos nesse setor.

Há dois movimentos internacionais que estimulam a expansão das florestas plantadas, nas quais são usadas variedades principalmente de eucalipto e pínus. Um deles é a busca por novas áreas de plantio e construção de fábricas em países como o Brasil, a Rússia, a Índia e a China. O outro impulso vem do intenso apetite mundial por commodities, puxado pelo crescimento chinês. Isso vale tanto para o segmento de papel e celulose como também para a siderurgia, que tem nas florestas plantadas a fonte de carvão vegetal para seus altos-fornos. Existem ainda frentes esporádicas de demanda, principalmente no segmento de construção. É por isso que nos últimos meses as principais indústrias do setor concluíram e já anunciaram investimentos de peso em florestas artificiais no Brasil. No fim de setembro foi inaugurada a Veracel, uma fábrica de celulose em Eunápolis, no sul da Bahia, montada por meio de parceria entre a Aracruz e o grupo sueco-finlandês Stora Enso. O investimento, desde o início dos anos 90, totalizou 1,2 bilhão de dólares. A Suzano também anunciou um aporte de 1,3 bilhão de dólares, em Mucuri, na mesma região, para a construção de uma unidade industrial. Estimativas das empresas do ramo indicam que as florestas plantadas devem atrair recursos da ordem de 13 bilhões de dólares até 2014 no Brasil.


Divulgação
Jamanta invertida: madeira picada é descarregada na Votorantim, em São Paulo, que produz celulose para exportação

A cifra é otimista, mas o país tem encantos para tanto. Fatores como a disponibilidade e a qualidade do solo, o regime de chuvas, a temperatura e a luminosidade – a quantidade de sol –, associados à pesquisa genética, fazem com que as matas artificiais brasileiras alcancem uma produtividade incomparável. Nas plantações nacionais, o eucalipto, que fornece uma matéria-prima de fibra curta, usada na produção de papéis de menor resistência, pode ser cortado num prazo de cinco a sete anos após o plantio. No Canadá e na Finlândia, importantes produtores de papel, esse prazo pode ser seis vezes maior. O custo da madeira numa fábrica brasileira também é inferior à metade do valor registrado nesses países. "Não há exagero em dizer que nenhum lugar do mundo reúne condições tão favoráveis como o Brasil para o plantio de florestas", diz o professor Laércio Couto, da Universidade Federal de Viçosa, em Minas Gerais. "E temos muito espaço a ocupar, sem oferecer risco às áreas de preservação, principalmente em pastagens degradadas." O detalhe: numa comparação mundial, o Brasil só começa a perder competitividade no momento em que são contabilizados os impostos, as despesas com escoamento e o custo adicional do crédito.

Em relação ao meio ambiente, as glebas de florestas plantadas no Brasil incorporaram avanços significativos nos últimos quinze anos. Nos anos 60, quando foram criados os projetos mirabolantes de reflorestamento no país, regados por fartíssimos incentivos fiscais, a história era diferente. Tanto que o famígero Projeto Jari, cravado na selva do Amapá em 1967, perdurou por muitos anos como um símbolo desse tipo de empreendimento. Sonho do americano Daniel Keith Ludwig, então na lista dos cinco homens mais ricos do mundo, o Jari estendia-se por uma área correspondente à metade da Bélgica. Foi montado para produzir celulose, arroz e carne bovina em profusão nunca vista. Sucumbiu de maneira quase tão delirante como surgiu.

Os projetos de reflorestamento, por sua vez, modernizaram-se, também por causa de severas certificações internacionais, aliadas à tecnologia. Hoje, as grandes florestas são plantadas em áreas intercaladas com matas naturais, formando verdadeiros mosaicos verdes. Isso porque, como são feitas com material genético homogêneo, as plantações não têm um sistema de defesa contra insetos. Poderiam ser dizimadas por punhados de bichinhos. "Mas, em equilíbrio com o ambiente natural, elas até se tornam mais resistentes, pois ganham os inimigos naturais contra possíveis agressores", diz José Totti, gerente de planejamento e pesquisa florestal da Klabin. Para completar, apesar de as florestas plantadas ocuparem apenas 8% da área cultivada do Brasil, elas fornecem 85% de todos os produtos de origem florestal encontrados no mercado. E esse é um alento, principalmente em um mundo que parece não querer diminuir tão cedo o consumo de papel, energia, móveis e materiais para a indústria de construção.

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