A ameaça do terrorismo
 

Os atentados de 11 de setembro de 2001 em Nova York e Washington D.C. sacudiram a opinião pública mundial, com graves conseqüências para a paz e a economia global. No presente artigo, apresentamos uma análise em torno do desafio colocado pelo terrorismo neste início de século.

A brutal dimensão dos atentados terroristas de 11 de setembro de 2001 contra as torres gêmeas do World Trade Center, em Nova York, e contra o Pentágono, em Washington D.C., nos quais morreram mais de seis mil pessoas, representam um divisor de águas na história contemporânea. Essas ações de "hiperterrorismo", como as chamaram alguns especialistas, esses "atos de guerra", segundo a expressão usada pelo presidente americano George W. Bush e alguns congressistas de seu país, deixam claro, com seu saldo de mortos e estragos causados, o tamanho da ameaça terrorista em nossos dias.

Depois dessa tragédia, as concepções sobre terrorismo estão sendo redefinidas, assim como as estratégias para combatê-lo e eliminá-lo. Os ataques de 11 de setembro acionaram um formidável aparato de investigação nos Estados Unidos e países aliados para encontrar os culpados e aqueles que lhes deram respaldo. Também se deu início à reestruturação de leis, métodos e instrumentos para estudar, investigar e lutar contra o terrorismo e seus agentes.

Novas modalidades de terrorismo

Os atentados contra o World Trade Center e o Pentágono mostraram que o terrorismo adotou novas modalidades não consideradas pelos especialistas: aviões de passageiros que antes eram alvos de ações de terroristas foram convertidos em armas de ataque.

Desde o fim da guerra fria, especialistas advertiram com certa regularidade sobre as ameaças que poderiam surgir no cenário internacional, entre elas o terrorismo por parte de grupos ou países mergulhados em conflitos internos ou guerras civis, como ocorre atualmente no Afeganistão. Alguns acadêmicos levantaram, inclusive, que "sentiríamos saudade" da ordem da era bipolar.

Na edição de novembro/dezembro de 1998 da revista americana Foreign Affairs - especializada em política e economia internacional - Ashton Carter, John Deutch e Philip Zelikow (*) escreveram que “se o artefato que explodiu em 1993 no World Trade Center tivesse sido nuclear ou dispersado eficazmente um agente letal, o horror e o caos resultantes teriam excedido nossa capacidade para descrevê-los”. Com relação aos atentados contra as embaixadas americanas no Quênia e na Tanzânia, no verão de 1998, os três especialistas afirmaram: "Tal ato catastrófico de terrorismo foi um divisor de águas na história americana. Implicou a perda, sem precedentes em tempos de paz, de vidas humanas e de bens e abalou a sólida sensação de segurança dos Estados Unidos, tal qual ocorrera no passado com a explosão da bomba atômica soviética em 1949. Como Pearl Harbor, este acontecimento dividiria o passado e o futuro em antes e depois." Sem que fosse necessário recorrer a armas apocalípticas, os Estados Unidos já sofreram esse atentado descomunal.

Entretanto, justamente pelo que ocorreu em Nova York e em Washington D.C., as advertências em torno de eventuais ataques terroristas com armas nucleares, químicas ou biológicas merecem maior atenção. É o que os especialistas chamam de "terrorismo catastrófico" e que até agora só havia sido descrito na ficção.

O relatório Countering the Changing Threat of International Terrorism ("Neutralizando a ameaça cambiante do terrorismo internacional"), da Comissão Nacional sobre Terrorismo dos Estados Unidos, divulgado em 2 de agosto de 2000, advertia que "qualquer ataque terrorista que utilize um agente biológico, elementos químicos mortais ou materiais radioativos ou nucleares, ainda que só tenha êxito parcial, poderia afetar profundamente a nação inteira."

Para alguns especialistas, esse "superterrorismo" é possível e se até agora não foi praticado é porque um mínimo de razão deve haver na mentalidade terrorista, numa hipótese otimista, ou porque os terroristas ainda não têm como realizar tal ataque de proporções apocalípticas. Mesmo assim, antes dos atentados ao World Trade Center e ao Pentágono já havia ocorrido um ataque terrorista que, ao que tudo indica, fora concebido com o propósito de causar danos a milhares de pessoas: a disseminação do gás sarin no metrô de Tóquio, por parte de um comando da seita japonesa Verdade Suprema, em março 1995, que acabou provocando a morte de dez pessoas e intoxicou outras cinco mil. Esses especialistas citam as palavras do ex-secretário de Defesa dos Estados Unidos William Cohen sobre a possibilidade de um ataque terrorista em grande escala: "A pergunta não é se, mas quando isso acontecerá."

Estratégias antiterroristas futuras

O que fazer agora para enfrentar o desafio imposto pelo novo terror? Como se preparar para travar um combate com um inimigo sem rosto? Segundo um relatório lançado em 2000 pelo órgão governamental que coordena as ações antiterror nos Estados Unidos, o terrorismo está ficando cada vez mais perigoso, pois, além de eventuais ataques com armas químicas, biológicas, radioativas ou nucleares, poderiam ocorrer ataques cibernéticos.

Com relação a essa última modalidade, John Deutch, professor do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, usou o termo "ciberterror" em um artigo publicado na Foreign Policy, no outono de 1997. Deutch ressaltou que "tecnicamente é fácil penetrar nos sistemas de telecomunicações e de computação de países e de organizações privadas e introduzir vírus que levem ao colapso os sistemas de computadores ou coloquem esses sistemas sob o controle de intrusos. Tais ciberterroristas poderiam não só desviar eletronicamente fundos bancários, como criar danos ao tráfego aéreo de um país ou nos sistemas que controlam as usinas de energia".

Nem todos os grupos terroristas são iguais, mas, segundo o Departamento de Estado, os grupos mais perigosos para os Estados Unidos compartilham algumas características: operam dentro e fora dos Estados Unidos; suas redes financeiras e logísticas cruzam fronteiras; são menos dependentes de países que os patrocinam; são mais difíceis de desarticular com sanções econômicas; utilizam amplamente as tecnologias disponíveis para comunicar-se rápida e seguramente; têm objetivos mais mortíferos.

Seguindo o postulado de que a melhor arma contra o terrorismo internacional é executar com eficiência a coleta e análise de informações, o órgão governamental que coordena as ações antiterror nos Estados Unidos definiu quatro princípios básicos para a cooperação antiterrorista internacional: 1) não fazer concessões aos terroristas e não aceitar acordos; 2) submeter os terroristas à justiça por seus crimes; 3) isolar e exercer pressões contra os Estados que patrocinam o terrorismo e obrigá-los a mudar sua conduta; 4) reforçar a capacidade antiterrorista de alguns países que colaboram com os Estados Unidos e requeiram assistência.

Combater o terrorismo "exigirá novos mecanismos de cooperação - tanto nacionais como internacionais", afirma Deutch, que admite que ações eficazes, sejam defensivas ou ofensivas, inevitavelmente implicarão alguma perda das liberdades civis, num quadro em que a população terá que se mostrar disposta a submeter-se a controles aéreos mais restritos ou tolerar medidas de vigilância.

Ashton Carter, John Deutch e Philip Zelikow alertam, porém, no referido artigo da Foreign Affairs que "medidas draconianas, autorizando a espionagem dos cidadãos, a prisão dos suspeitos e o uso de forças mortais", na luta antiterrorista pode ter um efeito negativo. Isso porque, o reforço das medidas de segurança e vigilância, como conseqüência dos atos terroristas, ameaçaria as liberdades civis. Nesse sentido, a maior vitória terrorista seria atingir um sistema de liberdade que desprezam.

Não se deve esquecer que o terrorismo também é doméstico, ou seja, pode estar vinculado a grupos que atuam dentro de suas próprias fronteiras. Antes do ataque ao World Trade Center e ao Pentágono, o maior atentado terrorista contra os Estados Unidos em seu território foi cometido em Oklahoma, no dia 19 de abril de 1995, por Timothy McVeight, um cidadão americano vinculado a grupos de supremacia branca. Este ataque provocou a morte de 168 americanos.

Também é preciso ter em mente que no combate ao terrorismo deve evitar-se qualquer ação discriminatória contra grupos étnicos ou nacionalidades às quais os grupos terroristas dizem representar. Como afirmam os especialistas no assunto, na realidade, os terroristas são membros de organizações minoritárias, que operam na clandestinidade, alheios aos interesses das sociedades onde se inserem. Lutar contra o terrorismo internacional supõe uma cooperação internacional em todos os níveis.

Outubro de 2001


(*)Na época em que escreveram o artigo, os autores exerciam os seguintes cargos:

Ashton Carter - professor de ciência e assuntos internacionais da Escola John F. Kennedy da Universidade de Harvard e ex-secretário assistente do secretário de Defesa.

John Deutch - professor de química no Instituto de Tecnologia de Massachusetts, ex-diretor da CIA e subsecretário de Defesa.

Philip Zelikow - ex-membro do Conselho de Segurança Nacional, professor de história e diretor do Miller Center of Public Affairs da Universidade de Virgínia.

Fonte: © Editorial Barsa Planeta, Inc. Todos os direitos reservados.


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