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A afasia - que é a alteração da capacidade de falar ou de compreender a linguagem falada ou escrita - é uma doença para a qual cientistas e pesquisadores do mundo todo ainda não encontraram um meio de cura, no sentido clássico de erradicação da enfermidade. "No entanto, pode-se dizer que há meios de melhorar a qualidade de vida das pessoas", explica a professora Edwiges.
Essa alteração dos processos lingüísticos ocorre tanto no aspecto produtivo da fala quanto no interpretativo da linguagem, e é causada por lesão estrutural adquirida no sistema nervoso central, em decorrência de acidentes vasculares cerebrais (AVCs), traumatismos crânio-encefálicos ou tumores. Há relatos médicos e terapêuticos assinalando que o processo de reabilitação requer, em geral, um tempo prolongado, que pode variar de seis meses a anos de tratamento.
A afasia pode ser acompanhada por alterações de outros processos cognitivos e sinais neurológicos, como a hemiplegia (paralisia de um dos lados do corpo), a apraxia (distúrbios da gestualidade) ou a agnosia (distúrbios do reconhecimento). Soma-se a esses fatores a dificuldade de deglutição. Entre os aproximadamente 20 afásicos que semanalmente freqüentam o CCA, há aqueles que sumariamente foram afastados dos seus postos de trabalho, aposentados por invalidez; são pessoas que antes da doença exerciam as mais diversas atividades profissionais como motoristas, enfermeiros, comerciantes e operários, entre tantas outras.
Edwiges conta que há também aqueles que por iniciativa própria ou com o apoio de familiares passaram a exercer outra profissão depois de afásicos. Um advogado, por exemplo, tornou-se massagista, um engenheiro civil tornou-se proprietário de banca de jornal. Há também os que, afastados de funções ocupacionais remuneradas, passaram a desenvolver outras atividades informais. Existem aqueles que procuram desenvolver seus hobbies como uma forma interessante de se ocupar, fazendo trabalhos de bordados, pintura e natação.
Benefícios - A professora explica que, em geral, o indivíduo afásico não chega a recuperar totalmente a sua linguagem, de modo a retomar integralmente o padrão anterior à lesão, embora possa chegar muito próximo disso. Os afásicos, familiares e terapeutas chegam a um determinado grau de aceitação e de convivência com as dificuldades da linguagem oral e escrita que tem a ver com a possibilidade da pessoa afásica de se sentir segura e competente para interagir, comunicar, trabalhar, enfim, exercer os mais diversos papéis dentro do meio em que vive.
Isso tem ajudado bastante o afásico a enfrentar, a superar ou aprender a conviver com as suas limitações. Sob o ponto de vista terapêutico o CCA prevê o acompanhamento multidisciplinar, que compreende atendimento com neurologista ou cardiologista, fonoaudiólogo, fisioterapeuta, terapeuta e psicólogo.
Sites
- Previdência Social:
www.previdenciasocial.gov.br
telefone 0800-780191, e Centro de Convivência de Afásicos
(CCA)
http://www.unicamp.br/iel/labonecca
Trabalhando
a auto-estima
O ambiente é tão saudável e descontraído
que mais parece um encontro de amigos. E na verdade é.
Ali estão pessoas com histórias de vida mais ou
menos parecidas. São pessoas afásicas e não-afásicas,
que duas vezes por semana se juntam para uma série de atividades
que levam ao desenvolvimento de práticas lingüísticas
cotidianas, combinando com exercícios corporais, de relaxamento
e de criação dramatúrgica, por exemplo. E
para conversar, trocar experiências e tomar um cafezinho.
Explicam que desde o momento que entraram para o CCA, passaram
a cultivar a auto-estima para dar um outro sentido a vida.
Nadir Felipe da Silva, 43 anos, está no grupo há dois anos. Vítima de derrame cerebral, diz que freqüentar o CCA é mais que buscar tratamento terapêutico. Explica que o relacionamento que mantém com outros afásicos pode atingir esse propósito. O ambiente ali é descontraído e, por isso mesmo, ajuda-os muito a superar eventuais limitações a que estão sujeitos. "Os benefícios proporcionados pelos profissionais daqui são tantos que não dá para falar de todos, além de nos proporcionar reflexão", diz.
O derrame que sofreu há dois anos e meio não impediu que José Madeira Lourenço passasse a ter uma vida quase normal. Aos 70 anos, aposentado (trabalhava com exportação), hoje - "pra eu não ficar parado" - desenvolve trabalhos que requerem extrema habilidade: a marchetaria - que é a arte de embutir, incrustar peças de madeira, metal ou marfim em peças de madeira, para a formação de desenhos. Lourenço conta que não pensa muito no seu problema. "Prefiro trabalhar”, faz questão de dizer. Embora não trabalhe todos os dias - não precisa mais fazer isso - Lourenço já produziu uma série de trabalhos, como pequenas caixas e objetos diversos.
Há três anos Natália da Fonseca, 70 anos, sofreu um derrame que afetou - lhe a fala. Olhinhos miúdos, cabelos brancos, Natália revela que há três anos sofreu um derrame cerebral que lhe afetou a fala. Não fumava, não bebia e não fazia extravagância. "Tinha que acontecer", conclui. Natural de Portugal, quase nem se lembra de suas limitações. Graças, talvez, a ajuda que tem do CCA. Gosta de ler livros espíritas, por meio dos quais busca um conforto espiritual complementar. Livros obrigatórios que lê com frequência: O livro dos Espíritos e O Evangelho segundo o Espiritismo.
Maria das Graças de Carvalho, 55 anos, que sofreu derrame há três, não conhece dificuldades de locomoção. Antes de adoecer - já aposentada - era proprietária de uma agência de viagem. Claro que a doença deixou-lhe algumas marquinhas. Mas nem por isso deixou-se abater, e continuou, na medida do possível, a viver normalmente. "Apesar do problema, consegui fazer todos os testes e tirar carta de habilitação e dirigir o meu próprio automóvel", conta Maria das Graças, rindo.
Centro
nasceu de
parceria entre IEL e FCM
O CCA da Unicamp atende atualmente cerca de 20 pessoas afásicas. Quando começou, há aproximadamente dez anos, surgiu praticamente de um encontro de apenas duas pessoas afásicas com as professoras do IEL, Edwiges Maria Morato e Maria Irmã Hadler Coudry, que pertenciam à Unidade de Neuropsicologia e Neurolinguística, e o professor Benito Damasceno, da FCM. Não demorou muito para que esse número crescesse. "Foi procurando enfrentar o isolamento social e proporcionar aos afásicos condições que lhes possibilitassem o desenvolvimento da linguagem e outras rotinas significativas da vida em sociedade, que criamos o Centro de Convivência dos Afásicos (CCA)".
O Centro, que funciona nas dependências do IEL, nasceu de uma iniciativa conjunta dos Departamentos de Lingüística (IEL) e de Neurologia (FCM). Ali, com a participação de professores, pesquisadores, familiares e terapeutas, os afásicos se reúnem duas vezes por semana, às segundas e às quintas-feiras, pela manhã. As atividades do Centro estão sob a responsabilidade das professoras Maria Irma Hadler Coudry e Edwiges Maria Morato, e do professor Benito Damasceno, como responsável pela condução do acompanhamento neurológico/neuropsicológico dos pacientes.
O livro Sobre as Afasias e os Afásicos está sendo
distribuído gratuitamente para entidades de referência
que trabalham com pessoas afásicas, centros e postos de
saúde do Brasil inteiro, além de instituições
que se ocupam do estudo, do ensino, do tratamento da doença,
como faculdades de fonoaudiologia, cursos de medicina, especialmente
aquelas que tenham disciplinas de neurologia, neuropsicologia
e fisioterapia.
Fonte:
Jornal
Unicamp