Profa. Dra. Lenise Garcia
 

Educação a distância na atualidade brasileira
por: Arlete Embacher

MiniWeb Educação - Devido às rápidas transformações que estão ocorrendo na sociedade brasileira e no mundo, vários países, inclusive o Brasil, se viram forçados a acrescentar em seus currículos elementos educativos transversais às clássicas disciplinas acadêmicas. Perguntamos: Qual a definição e a importância dos Temas Transversais para as nossas Escolas e para o nosso país em médio prazo?

Resposta - Acho interessante essa colocação sobre a "atualidade" dos temas transversais, ou sua vinculação com as rápidas transformações mundiais. Os próprios PCN tratam-nos como questões sociais urgentes. Sem dúvida, sentimos uma grande urgência de que a educação não se restrinja a conteúdos disciplinares, mas tenha como meta o desenvolvimento integral do educando. Entretanto, a palavra urgente traz uma idéia de temporalidade que a meu ver não é adequada, pois são aspectos que sempre foram e sempre serão muito importantes na educação. Os PCN, deixando espaço para outros, trabalham 5 temas transversais nos 2 primeiros ciclos (1a a 4a séries): Ética, Pluralidade Cultural, Meio Ambiente, Saúde e Orientação Sexual. Nos 2 últimos ciclos, acrescentam a estes "Trabalho e Consumo". Eu diria que são temas urgentes pela sua ausência, mas perenes. Tomemos a ética, que além de constituir um tema em si de certo modo está contemplada em todos. Na verdade as questões éticas muitas vezes aparecem de modo implícito e é conveniente que sejam tratadas explicitamente. Conceitos de história, geografia, ciências, são continuamente perpassados por juízos de valor. Daí a necessidade de uma abordagem "transversal", perpassando as disciplinas.

 

 

MiniWeb Educação - Como a equipe técnica administrativa e os professores devem trabalhar os temas transversais no currículo da Escola?

Resposta - Eu diria que em primeiro lugar com coerência. As próprias relações humanas que se estabelecem no ambiente escolar, entre alunos, professores, funcionários e pais podem ensinar muito nessa temática. Seria inútil, inclusive, abordá-la teoricamente sem um reflexo prático nas atitudes das pessoas.

Depois, são necessários estudo e planejamento. Sabemos como infelizmente é frequente que aquilo que é "de todos" acabe por ser considerado "de ninguém".

Muitas escolas estão abrindo "espaços", "momentos" para tratar os temas transversais, com palestras, "Semanas do Meio Ambiente" e correlatos. Sem dúvida já é um avanço, se considerarmos que essas questões muitas vezes encontravam-se ausentes. Mas essas atividades perdem muito da sua eficácia se não estiverem presentes ao longo do ano, em reflexões e atitudes permanentes.

A pergunta fez referência ao currículo. Os temas transversais devem estar presentes de modo "curricular" e não "extra-curricular" - o que não quer dizer que precisem ser aprisionados nas chamadas "grades curriculares". Pelo contrário, considero o tratamento concreto dos temas transversais um excelente modo de superarmos essas grades, dando um enfoque diferente a toda a aprendizagem.

MiniWeb Educação - Dra. Lenise, todos concordamos com a visão mais moderna e a flexibilidade proporcionada pelos PCN de 1997 quanto ao currículo, deixando com isso um espaço para a criatividade do professor para a elaboração de suas aulas. Perguntamos: Qual deve ser o papel da Direção Escolar e da Coordenação Pedagógica de escola pública, diante do professor ainda resistente e acostumado a utilizar planos anteriores já prontos, ou do professor que pouco tempo tem para desenvolver com criatividade suas aulas devido à sobrecarga de trabalho em várias Escolas pela sua necessidade econômica?

Resposta: A Direção Escolar e a Coordenação Pedagógica tem um papel fundamental. Com frequencia elas é que são as mais resistentes, não abrindo espaço para professores ou alunos que tragam propostas inovadoras.

Não é fácil mudar aquilo que está estabelecido, mesmo que seja por uma prática sem qualquer fundamentação. Todos nós temos resistências. Também não se trata de querer mudar tudo, como se nada do anterior prestasse.

O fato é que todos gostamos de liberdade, mas não da responsabilidade e do trabalho que a liberdade traz consigo. Quando se tenta o novo, também é preciso ter em conta que se correm riscos. Penso que muitas vezes o medo de errar é um dos fatores preponderantes para não se ousar, mais do que o comodismo de usar planos prontos. Mas os professores sabemos, mais do que ninguém, que o erro é algo inerente à aprendizagem.

Tanto a criatividade como a ousadia ficam facilitadas quando se faz um trabalho coletivo. Nesse sentido, a Direção Escolar e a Coordenação Pedagógica podem ajudar muito, facilitando a integração das pessoas e os momentos concretos de planejamento.

MiniWeb Educação - Os educadores compromissados com o Ensino de qualidade, muitas vezes se frustram quando se deparam com as situações reais de nossas escolas, onde alunos não compromissados com o aprendizado ou , o colega ainda resistentes a um trabalho participativo e colaborativo, dificultam ou impossibilitam qualquer mudança de atividade no Ensino. Como deve agir ou atuar o professor nessa situação?

Resposta: O desenvolvimento dos temas transversais leva em geral a um maior compromisso por parte dos alunos. Temos um ciclo vicioso de pouca autonomia - pouca liberdade - pouca responsabilidade que é muito desestimulante para o aluno e prejudica a sua formação como cidadão. Dizemos que o aluno não é compromissado, mas não lhe damos muitas vezes oportunidade de assumir compromissos.

Concordo que não é fácil romper esse ciclo, mas penso que é o único caminho. Trabalhar por projetos, em torno a problemáticas concretas que afetam a comunidade, tem trazido ótimas experiências. Conheço alguns professores que iniciaram trabalhos bastante solitários e foram aos poucos recebendo apoio da comunidade escolar ou mesmo circundante. Alguns colegas renitentes foram se envolvendo, ao ver que os alunos estavam entusiasmados e aprendendo. Penso ser esse outro mito que é preciso quebrar, o de que o aluno aprende menos os conteúdos "curriculares" quando há atividades concretas que substituem as aulas. Essas atividades podem atingir também muitos objetivos das tradicionais disciplinas, se forem levadas a cabo de modo adequado.

MiniWeb Educação: Dra Lenise, por favor, fale para os Internautas da MiniWeb Educação sobre o trabalho que a Sra. desenvolve na UnB, sobre o "Espaço para o diálogo entre a Universidade e o Ensino Básico".

Resposta - Há algum tempo eu conversava com outro professor sobre as "ilhas de excelência" que ainda são, apesar das inúmeras dificuldades, muitas Universidades públicas. Ele destacava bastante a questão da excelência e eu comentei que concordava que tínhamos que mantê-la ou mesmo melhorá-la - mas que precisávamos tornar-nos menos "ilhas".

O bom na Educação é que não perdemos aquilo que damos. Pelo contrário, o partilhar enriquece a todos. Foi neste espírito que propus há alguns anos um programa continuado de Extensão que deu origem ao site "Educação e Ciência on-line". Trabalham nele alguns alunos da UnB, como bolsistas ou voluntários, sob minha coordenação. Estamos abertos a outras participações e contribuições, que serão muito bem-vindas.

Os alunos produzem alguns textos sobre questões de atualidade, com os conhecimentos que adquirem na Universidade e fazendo novas pesquisas. Trabalham também na seleção de links e eventos. Ainda temos um funcionamento bastante artesanal, mas estamos progredindo.

Na seção de Genética, os alunos da UnB vem ajudando apenas na formatação para a Web. O trabalho foi todo produzido por estudantes do Ensino Médio, com uma capacidade de compreensão e aprofundamento que bastante me surpreendeu, embora eu sempre tenha acreditado nas possibilidades dos jovens quando lhes damos a oportunidade de se desenvolverem.

As novas tecnologias proporcionam-nos excelente oportunidade de rever não apenas as metodologias e modalidades como alguns objetivos da Educação. A informação está hoje muito disponível. Os estudantes - tanto no nível Básico como no Superior - precisam desenvolver as competências necessárias para encontrar a informação, selecioná-la, analisá-la, tirar as suas próprias conclusões, compartilhá-la. Estou aprendendo algumas dessas coisas juntamente com eles.


Entrevista com Dra. Lenise Aparecida Martins Garcia - Departamento de Biologia Celular - Universidade de Brasília - Coordenadora do projeto "Um espaço para o diálogo entre a Universidade e o Ensino Básico" - Site Educação e Ciência On-line.

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