Prof. Dr. Wilson Azevedo
 

O papel do Ensino a Distância no Brasil e perspectivas futuras na Sociedade da Informação e do Conhecimento.
por: Arlete Embacher

Entrevista feita pela Miniweb Educação com o Prof. Dr. Wilson Azevedo - Diretor da Aquifolium Educacional e ex-diretor do Conselho de Ética da Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED), cursou o mestrado em Ciências da Religião e o doutorado em Antropologia Social.

Miniweb Educação - Professor Wilson, é notório que hoje o Senhor é um dos maiores especialistas em Educação a Distância no Brasil, que sua dedicação e pesquisa sobre o tema remonta aos anos de 1986. Pergunta: Gostaríamos de saber o que dificulta atualmente a engrenagem definitiva do Ensino a Distância no Brasil? A burocracia governamental seria um dos motivos? Ou a espera de subsídios para as Instituições interessadas na implementação? Ou ainda o preconceito existente em aderir a EAD?

Resposta –Antes de mais nada, duas correções:

- foi muita bondade de sua parte classificar-me como "um dos maiores especialistas", mas tenho sido na verdade um aprendiz aplicado que tem se dedicado a aprender mais neste campo, que é novo para todos nós.

- trabalho com EaD desde meados dos anos 90, não dos 80. Foi na Embratel, entre 94 e 95, que comecei a trabalhar com isto, no momento em que a empresa montava a estrutura do que veio a ser a Internet comercial brasileira.

 

 

Quanto à pergunta, eu acho que de tudo um pouco, cada fator interfere a sua maneira. Mas os fatores que dependem do governo estão até surpreendentemente sendo eqüacionados: a burocracia do MEC está andando mais rápido que há alguns anos, e começam a aparecer solucões criativas para suprir de recursos projetos de EaD, como os que envolvem a chamada UAB, a Universidade Virtual Brasileira.
Agora, o que vai ser mais lento e mais difícil de superar é mesmo o preconceito. Este a gente encontra inclusive entre profissionais que trabalham com EaD. Recentemente participei de um grupo de discussão que envolvia professores que trabalham com EaD. Alguém perguntou "o que você faria se seu filho escolhesse estudar a distância?". Foi impressionante: a maioria daqueles professores desestimularia seu filho para não fazer isto, que EaD exige maturidade e autonomia, que seu filho não tinha isso etc. Ou seja, EaD é para os outros, para o meu filho, não. Isto me impressionou. O preconceito de quem não tem experiência própria com EaD a gente até entende e espera que caia com a expansão da EaD e com a difusão da experiência social com EaD. Mas o preconceito na cabeça do próprio profissional de EaD, isto me parece não só difícil de aceitar; acho mesmo difícil de superar. Pode ser coisa para uma geração, algo que exija talvez uns 20 anos para ser vencido...

Miniweb Educação - Professor Wilson, qual a sua visão e avaliação do Programa da Sociedade da Informação, e do Programa Nacional de Informática na Educação (Proinfo – e-proinfo)?

Resposta – Conheço muito pouco deste programa, não muito mais do que o que sai na imprensa.

Penso que estamos entrando numa fase diferente, em que não apenas pensamos em pôr computadores nas escolas, mas passamos a pensar em pôr computadores pessoais nas mãos das crianças, para elas levarem para casa como levam livros escolares. Acho significativa esta mudança. Estamos entrando num outro nível de tratamento da informática educativa com isto, com repercussões não apenas na vida das crianças, mas também na de seus familiares e vizinhos.


Miniweb Educação - Segundo a Professora Lúcia Carvalho Pinto de Melo, diretora do CGEE, um dos objetivos do Livro Verde (2001) é despertar a sociedade brasileira para o imenso desafio que temos de enfrentar como nação para criar condições de participarmos de forma ativa e mais igualitária na nova sociedade da informação e do conhecimento. Cabe a nós buscar estratégias que propiciem a inclusão do maior número possível de pessoas às novas tecnologias, ampliando oportunidades de educação, promovendo o surgimento de novos negócios, a valorização de nossa identidade cultural e da cidadania através da universalização de acesso e de uma adequada exploração dos benefícios da ciência e tecnologia. Pergunta: Como o Ensino a Distância pode ajudar nesse quesito? Quais os obstáculos existentes para atingirmos esse desafio proposto a quatro anos?


Resposta – Acho que nós que militamos na EaD hoje temos que pensar mais de forma sintonizada com alguns cenários possíveis. Um deles é o de termos muito em breve, em curto para médio prazo, um número cada vez maior de usuários de computadores e de Internet vindos das classes C e D. Acostumamo-nos a pensar que Internet é coisa de rico e pensamos que projetos de Educação Online deveriam ser pensados para elites, enquanto que programas de EaD para os mais pobres não deveriam ser projetados para usar a Internet. As coisas mudam rápido nesta área e não é nada impossível chegarmos ao final desta década com uma maioria de usuários de classes C e D na Internet. Portanto, acho que um primeiro obstáculo a ser vencido é no olhar dos profissionais de EaD: precisamos vencer nossa miopia com relação ao futuro, enxergar um pouco mais longe e deixar de ficar parados lamentando a exclusão digital. Daqui a pouco tempo esta exclusão ficará no passado e se continuarmos nesta historia de lamentar e imaginar que pobre não tem acesso a Internet vamos ser pegos pelo futuro...

Miniweb Educação - A palestra do Secretário Nacional de Educação a Distância, Ronaldo Mota, durante a abertura do 12º Congresso Internacional de Educação a Distância, foi marcada por uma visão moderada, mais pedagógica que técnica sobre o assunto. Ele defendeu uma maior atenção educacional ao tema e negou que a educação a distância seja solução para todos os males da educação. Mota citou o educador baiano Anísio Teixeira que, em 1932, já previa a invasão de outros meios de comunicação e da arte na escola, como o cinema, que forçaria uma mudança de papel da educação e do professor. "A crise hoje não é entre a educação presencial e a educação a distância, mas entre a educação tradicional e uma educação moderna, que tenha abrangência de outros meios", analisou. Pergunta: Qual a sua opinião sobre a fala do secretário?

Resposta – Adotamos a mesma perspectiva. E penso que o ensino superior é o terreno em que o embate será mais dramático entre estas posições. É o segmento mais resistente a mudanças metodológicas, com um nível de formação pedagógica específica próximo do zero. Predomina o instrucionismo no ensino superior. O desafio neste segmento é imenso.


Miniweb Educação - Professor Wilson, muito se tem falado que os professores ainda resistem ao uso do computador e as novas tecnologias. Sabemos que sempre houve na maioria das escolas públicas de São Paulo, tanto estaduais como municipais, nas décadas de 70, 80 e 90 material didático para utilização dos professores. Por exemplo: os antigos projetores de filme em rolo de 16mm, (os filmes eram solicitados via Delegacia, DREM, ou na USP), projetores de slides, retroprojetores, gravadores de fita cassete, televisão, vídeo, sempre foram pouco utilizados pelos docentes, muitos deles alegando que não “gostavam” de manusear os aparelhos. Logo, eram deixados em segundo plano com empobrecimento para a rotina pedagógica. Em outras situações, eram tão bem guardados pela equipe administrativa que desestimulava aqueles que pretendessem utilizá-los. Pergunta: Até que ponto as inovações de qualquer época assustam o homem e qual a visão que deve ter um professor para conviver e ensinar na Sociedade da Informação para sermos competitivos num mundo globalizado?

Resposta - Basta observar como estes professores foram formados. Estes recursos foram utilizados com eles? Se não foi julgado útil utilizar outros recursos na formação destes docentes, por que deveriam eles imaginar serem estes recursos importantes?
Professores tendem a reproduzir aquilo que vivenciam nas suas experiências como alunos. Se, como alunos, eles participam de uma experiência rica para a aprendizagem utilizando outras tecnologias que não apenas o giz e o quadro, eles tenderão a procurar reproduzir estas experiências como professores. Esta é uma equação muito simples. Ninguém conseguirá introduzir inovações tecnológicas na pratica pedagógica destes docentes no seu cotidiano sem que estas inovações estejam presentes na formação destes professores. O problema é anterior, na formação do professor, e tem a ver com a resistência do professor de nível superior que forma professores de níveis fundamental e médio. Este professor não adota novas tecnologias nem novas metodologias. Seus alunos, futuros professores, também não adotarão porque não vivenciaram estas coisas na sua experiência como alunos. O circulo vicioso precisa ser rompido e o local estratégico para isto é o nível superior.


Miniweb Educação - Uma das características que mais respeitamos no seu trabalho é a sua defesa para o trabalho colaborativo em EAD. Pergunta: Quais são os principais fundamentos para um trabalho colaborativo e participativo, visto que ainda percebemos a desconfiança em grande parte das pessoas em partilhar conhecimento? É possível que as pessoas assumam um comportamento mais inovador em uma situação de incoerência no ambiente de trabalho?

Resposta
Colaboramos não porque sejamos bonzinhos ou bem intencionados. Colaboramos porque precisamos, porque não temos outra maneira melhor para vencer as dificuldades, resolver nossos problemas, aprender mais. Sozinhos não conseguimos nada. O indivíduo isolado é uma ficção, um recorte metodológico feito por algumas disciplinas científicas que levamos a sério em demasia. Não existe indivíduo isolado em estado bruto. Somente encontramos seres humanos em coletividades, interagindo e colaborando o tempo todo em todos os lugares.
Até para competir precisamos colaborar. Não conseguimos enfrentar os adversários sozinhos. Aliamo-nos a outros que também desejam superar o mesmo oponente, juntamos esforços e colaboramos uns com os outros. Pierre Levy nos lembra que competição e colaboração não são coisas excludentes: a cooperação competitiva ou a competição colaborativa são a forma como colaboramos e competimos.
As pessoas que resistem partilhar saber são as mais mal sucedidas. E os mais bem sucedidos no mundo de hoje são os que competem colaborando e colaboram competindo.

Miniweb Educação - Segundo artigo da HSM Management número 52, cujo título é Os blogs, a confiança e os negócios afirma que: ... “ A maioria das pessoas, pelo menos nos EUA, está confiando menos nas “figuras com autoridade” e mais em “gente como a gente”. É o que mostra a pesquisa de confiança da Edelman realizada em 2005, segundo a qual 56% dos norte-americanos acham que apenas médicos e acadêmicos podem ter opiniões que mereçam mais respeito que as suas próprias ou a de seus amigos.... A informação que aparece nos blogs pode ser considerada “jornalismo apaixonado” completamente subjetiva. A maioria dos blogs permite que outros usuários ou leitores expressem ali seus próprios comentários, permitindo uma conversa coletiva. ... Versão on-line do boca a boca, os blogs se prestam a numerosas aplicações pelas empresas: pesquisas de mercado, análise de boatos (ou de forma pela qual as pessoas com interesses comuns repassam informações), publicidade disfarçada.” Pergunta: Qual a importância dos blogs para a Sociedade da Informação e do Conhecimento? Quais as vantagens e desvantagens no seu uso?

Resposta – Eu vejo duas coisas com relação aos blogs - e falo como usuário de Internet comum.
Por um lado vejo muita fumaça e pouco fogo. A blogosfera tem seus usuários e seus freqüentadores. Mas a maioria dos usuários da Internet não está ali. O fenômeno ainda é restrito, tanto em termos de gente que mantém blogs, quanto em termos de leitores de blogs. E não vejo sinais de que o número de usuários de blogs vá crescer tanto assim. Pelo menos por enquanto os usuários têm uma atitude menos entusiasmada e apaixonada em relação aos blogs. Podem acabar acessando um ou outro blog, mas não os encaram como coisa muito diferente de uma página como outra qualquer. Basicamente eu não navego muito na blogosfera porque não tenho muita paciência com a profusão de exibição de egos e de conteúdo de baixa qualidade que prolifera ali. E não estou isolado nesta posição. Ninguém agüenta isto por muito tempo, por mais entusiasmado que seja com blogs.
Por outro lado, vejo os blogs forçando a mídia comum a ser mais abrangente e a incluir mais visões na forma como acompanha os fatos. Ser desmascarado ou superado por um blog individual é uma vergonha para um grande veículo. Blogs que dão furos que a imprensa não dá, que mostram pontos de vista para os quais a imprensa não liga, mas que os demais usuários levam em conta e a sério, são uma ameaça séria. Por isto estamos vendo os blogs sendo adotados como estratégia, a abertura de blogs para colunistas, a inclusão de mais pontos de vista na imprensa.
Eu acho que blogs dão seqüência a uma tendência que acompanha a Internet desde suas origens: há espaço para todos, de quaisquer tamanhos. A voz do usuário na Internet pode ser ouvida. Isto está no DNA da Internet e os blogs são mais uma ferramenta de apoio a isto.

Miniweb Educação - Para finalizarmos, gostaríamos que o Senhor falasse um pouco de seu trabalho na Aquifolium e dirigisse uma mensagem aos alunos e professores internautas da Miniweb Educação cujo interesse principal é a EAD.

Resposta - A Aquifolium Educacional vem procurando criar espaços para a atualização e a formação continuada de profissionais de Educação Online. Neste sentido promovemos cursos online, grupos de estudos online, workshops virtuais e encontros online que visam incentivar uma renovação metodológica para acompanhar a inovação tecnológica. Ainda agora neste inicio de 2006 estamos com cursos e grupos de estudos programados para acontecer nesta direção e convidamos todos a visitarem http://www.aquifolium.com.br/educacional para obterem mais informações a este respeito.
Nossa mensagem aos que buscam se aperfeiçoar ou querem começar a atuar em EaD é que não se deixem ofuscar pela tecnologia. Compreendam que a principal mudança em curso não é fundamentalmente tecnológica, mas pedagógica. E esta mudanca precisa ser liderada e incentivada por educadores que não se deixam ofuscar pela tecnologia, que mantém o bom senso, que continuam com a cabeça no lugar e por isto são capazes, inclusive, de optar por não adotar tal ou qual tecnologia, de não cair na conversa de vendedores e de tomar decisões sensatas com base em sólidos fundamentos pedagógicos. Manter a serenidade e o equilíbrio são fundamentais nos momentos de maior confusão em que o alarido dos entusiastas e dos vendedores deixam tantos "zonzos", sem saber distinguir urubu de papagaio.

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