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do Brasil
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Uma história de jornais
Como a propaganda já era a alma do negócio, para conseguir fregueses, tanto os profissionais de grandes estúdios como os ambulantes divulgavam seus serviços em periódicos, e é pela recuperação desses reclames – em que estão descritos os cenários de que dispunham, a tecnologia que utilizavam, e como se apresentavam aos clientes – que o autor reconstrói essa história. “A reprodução de trechos dos anúncios no Dicionário é também uma forma de dar voz a esses homens, de mostrar como eles se dirigiam ao seu público, de recuperar o sabor do tempo”, comenta. O surgimento de novas técnicas fotográficas também pode ser estudado tomando por base esses textos espalhados, ao longo dos anos, por pequenos e grandes jornais de todos os Estados.
Já em 1850, a daguerreotipia caiu em desuso. “Foi uma transição muito rápida”, explica Kossoy, e o retrato se popularizava com o ambrótipo e o ferrótipo. Os cartes de visite tornam-se o grande sucesso da época. Nesses pequenos cartões, uma fotografia sobre papel albuminado era colada sobre um cartão-suporte, e eles eram oferecidos como sinal de afeto a amigos e parentes. Um outro grande momento de expansão registrado no Dicionário dá-se em 1862, quando a fotografia passa a ter como suporte o papel. Segundo o professor, “é a partir da difusão da técnica da fotografia sobre papel que acontece a democratização da imagem do homem”.
Um outro dado que surge dos verbetes e do mapeamento da atividade fotográfica nos Estados é como os fotógrafos estrangeiros foram, gradativamente, sendo substituídos por profissionais locais. Nas duas ou três primeiras décadas do ofício no Brasil, os fotógrafos eram quase todos estrangeiros – norte-americanos, suíços, alemães e franceses. Depois disso, no entanto, a situação passa a se inverter. O número de nacionais no ramo cresce e eles logo se equiparam e ultrapassam os pioneiros. Esses primeiros fotógrafos genuinamente brasileiros foram os aprendizes dos estrangeiros, rapazes que, trabalhando nos estúdios como seus ajudantes, acabaram aprendendo a arte, seus truques, e passaram a substituir os mestres.
Trampolim de pesquisas
Os fotógrafos do século 19 tinham como principal atividade o retrato. Era eternizando a imagem de pessoas e famílias em pomposos cenários à moda vitoriana que eles ganhavam a vida. Ainda assim, alguns deles encontraram tempo para se dedicar à fotografia paisagística e documentar belas cenas do traçado urbano, das cidades, das vilas, do comércio e das fazendas dos barões do café. “Sem esse documento visual que é a fotografia, não se poderia conceber hoje o estudo histórico. Cada vez mais a história e as ciências sociais se valem de fontes iconográficas”, diz Kossoy. Para o professor, a mais importante contribuição desse seu livro é justamente abrir pistas e fornecer as fontes para que outros pesquisadores possam ir atrás desses fotógrafos, descobrir materiais, documentação sobre eles e partirem para suas próprias monografias. “Esse é, eu acredito, o trampolim para que seja desencadeado um processo de pesquisa e de investigações sobre a fotografia. Indo além, o material presente no Dicionário extrapola o interesse da fotografia como forma de expressão e é extremamente importante para a história social, a história da publicidade, da arte e da imprensa, já que você encontra aqui pequenos jornais de que ninguém jamais ouviu falar.”
Para se constituir como fonte de estudos futuros, o historiador não prescindiu das referências, que foram todas valorizadas. Em cada verbete é apresentada a fonte em que o registro foi buscado e abre-se, dessa maneira, a possibilidade de datar documentos hoje perdidos no tempo, usando parâmetros historiográficos precisos e seguros. “Não existe uma história da fotografia desvinculada da história social”, define Kossoy. “Esse trabalho de pesquisa das imagens tem que ser feito por nós, latino-americanos, porque é através dos documentos iconográficos e de seus autores que poderemos descobrir muito desta América, que ainda está encoberta.”
Dicionário Histórico-Fotográfico Brasileiro – Fotógrafos e ofício da fotografia no Brasil (1833-1910), de Boris Kossoy, Instituto Moreira Salles, 404 páginas, R$ 78,00.
O início de tudo,
em 1833
O homem que reconstrói a história que há por trás das imagens e de seus autores anônimos tem os olhos grandes, quase saltados das órbitas. Ainda que se movam sem pressa, a uma observação mais atenta parecem dois obturadores verdes, tomados por uma curiosidade latente, por um desejo de capturar tudo, todo o entorno, de não deixar que nada seja tragado pelo tempo. Quando começou a trabalhar, Boris Kossoy dividia o seu tempo entre a câmera fotográfica e a prancheta de arquiteto. No primeiro estúdio que abriu, dedicava-se ao retrato e à ilustração e desenvolvia, paralelamente, as imagens que dariam origem à série “Viagem ao fantástico”. As fotografias que tirou nesse período estão nas coleções permanentes de importantes instituições, como o Museu de Arte Moderna de Nova York, o Museu Metropolitano da mesma cidade, a Biblioteca Nacional de Paris e o Museu de Arte de São Paulo (Masp).
Hoje professor do Departamento de Jornalismo e Editoração da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, Kossoy tem se dedicado, nos últimos anos, à atividade de pesquisador e teórico da história da fotografia no Brasil e na América Latina. Com mais de dez livros publicados, sua obra mais conhecida é Hercule Florence, 1833: a descoberta isolada da fotografia no Brasil. Com grande repercussão internacional, o livro prova que, sete anos antes de Daguerre anunciar sua descoberta à Academia de Ciências de Paris, um outro francês, Hercule Florence, radicado no Brasil, já imprimia rótulos de farmácia e diplomas em papéis sensibilizados com sais de prata. Essas experiências, feitas por Florence na Vila de São Carlos, onde hoje fica Campinas, permanceram obscuras até a publicação do livro de Kossoy e é a partir da data do experimento, 1833, que ele marca o ponto inicial do seu Dicionário Histórico-Fotográfico Brasileiro – 1833-1910.
Fonte:
http://www.usp.br/jorusp/arquivo/2002/jusp622/pag0809.htm