Chiquinha
Gonzaga
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A sociedade patriarcal brasileira delegava poderes extremos ao homem; às mulheres, era oferecida apenas a reclusão do lar, a vida doméstica junto à criadagem escrava. Poucas mulheres ousavam desafiar seus pais e maridos; quando isso ocorria, logo eram reclusas em casas de correção e conventos.
Desde 1808, com a chegada da Família Real ao Brasil, as mulheres passaram a circular mais pelas ruas, dançar em recepções festivas da Corte, comparecer a saraus, teatros e ópera.
Mas o Rio de Janeiro dessa época ainda era a cidade das chácaras, com uma incipiente urbanização e uma população basicamente de negros e mestiços. A cidade, aos poucos, transformava-se em um centro metropolitano, à medida que cresciam as demandas do comércio exterior. As modas, costumes e o consumo se alteravam, ganhando ares europeus. O porto do Rio de Janeiro tornou-se o centro financeiro e comercial do Império, negociando-se café, escravos e mercadorias estrangeiras que deslumbravam os novos consumidores.
Mesmo com todas as mudanças sociais, os padrões e a austeridade patriarcal permaneciam inabaláveis. Para a jovem Francisca, nada lhe restava a não ser obedecer às ordens de seu pai. Foi assim que, em 1863, com apenas 16 anos, Chiquinha casou-se com Jacinto Ribeiro do Amaral, "jovem garboso" de 24 anos, estatura média, olhos azuis, oriundo de família distinta e muito rica. Finalmente aquela menina iria transformar-se em uma dama...
Chiquinha Gonzaga os Chorões
O encontro de Chiquinha Gonzaga com o meio boêmio carioca aconteceu num momento de rebeldia da compositora. Seu casamento não ia bem, a separação era a única saída. Uma mulher separada no século XIX ? Chiquinha pagou um preço alto. Foi expulsa de casa por seu pai, que, a partir daquele momento, renegou sua paternidade. Com o filho João Gualberto ainda no colo, ela partiu em busca de uma nova vida. Quem sabe era a oportunidade de seguir seu desejo: tornar-se uma compositora. Sem ter para onde ir, Chiquinha foi recebida pelo meio musical carioca, iniciando, então, um convívio fundamental para sua futura formação.
Conheceu músicos famosos, como Calado, que tornou-se seu amigo e protetor. Conhecido como Calado Jr. até a morte de seu pai, teve formação erudita, mas, desde cedo, era presença marcante nos grupos de choro do Rio e "pode ser considerado o criador do choro e nacionalizador da música popular", segundo Edinha Diniz . Sua primeira composição editada, a polca Querida por todos (1865), foi dedicada à Chiquinha.
Calado convidou-a para ser a pianeira de seu conjunto O Choro do Calado. Chiquinha começou a tocar em bailes e teatros recebendo dois mil réis por noite.
Chiquinha passou a frequentar festas e reuniões de chorões, compondo a polca Atraente, em 1877, que, editada na véspera de Carnaval, fez um enorme sucesso.
Por volta de 1899, Chiquinha mudou-se para o bairro do Andaraí. Lá, os cordões carnavalescos faziam grande sucesso, agremiando moradores e foliões de diversos cantos da cidade. Um dia, em sua casa, ao ouvir despreocupadamente os ensaios do cordão Rosa de Ouro, sentou-se ao piano e compôs uma marcha em homenagem ao grupo. Assim nasceu a primeira música de carnaval. Até então, nenhum compositor havia elaborado uma composição para um cordão carnavalesco, o que existia eram estribillhos populares, sem melodia elaborada Edinha Diniz, (op.cit. p.186). A marcha Ô Abre Alas tornou-se o seu maior sucesso e é tocada até hoje em todos os bailes carnavalescos.
A melhor divulgação para a nova marcha foi mesmo o teatro. Na peça Não Venhas, Chiquinha a incluiu no repertório, sendo a marcha muito bem aceita pelo público. Era o carnaval que ganhava o teatro, "numa época em que as classes sociais mantinham seus espaços rigidamente definidos. Chiquinha não hesita em trazer para o salão o que era da rua." (Edinha Diniz op.cit. p.186)
Bibliografia: