Em uma cena do filme
Matrix Revolutions, a personagem Trinity
se vê frente a frente com a personagem Merovingian
que tem Neo aprisionado. Em uma atitude
inesperada, ela aponta uma arma para a cabeça de
Merovingian e, mesmo cercada por todos os
capangas, ameaça atirar. Merovingian argumenta que
se ela atirar todos morrem, e isso seria uma
decisão irracional, pois todos perderiam.
Persephone, parceira de Merovingian, diz então que
sabe que Trinity irá atirar, pois o fato de estar
apaixonada a torna irracional.
Agora pense na seguinte
situação: um cliente está planejando trocar o seu
principal fornecedor por um concorrente. Para que
isso não ocorra, ele está exigindo vantagens
adicionais do atual fornecedor. O fornecedor atual
acredita que a troca será difícil de acontecer,
pois o seu cliente tem o seu produto integrado a
uma série de outros produtos e processos com os
quais lida no dia-a-dia. Ou seja, uma troca
envolveria custos altíssimos de transição, o que
torna forte a posição do atual fornecedor.
Todavia, ignorar as ameaças também seria perigoso,
pois o fornecedor poderia vir a perder um cliente
valioso, além de prejudicar a sua imagem. O que
cada parte deve fazer?
Teoria dos
Jogos – Estes são dois problemas
clássicos de uma área que os matemáticos chamam de
Teoria dos Jogos: coleção de técnicas que podem
ser utilizadas para encontrar a melhor estratégia
quando se enfrenta posições antagônicas em
situações de confronto ou mesmo de
colaboração.
As técnicas baseadas
nesta teoria esperam que você pense cuidadosamente
antes de agir; que reflita sobre seus objetivos e
preferências, bem como sobre as possíveis
limitações e restrições envolvidas; e que escolha
suas ações de uma maneira calculada para atingir
os melhores resultados. Se você agir assim,
diremos que você está agindo racionalmente. Mas
será que as pessoas estão sempre agindo dessa
maneira? O que o fornecedor poderia fazer se o
cliente acima não se preocupasse com os possíveis
problemas e perdas que enfrentaria e realmente
mudasse de fornecedor?
Em Matrix
Revolutions a coisa é mais complicada.
Qualquer teoria que tente modelar algo tão
complexo quanto um conflito emocional por meio de
um punhado de fórmulas e números está realmente
procurando por mais problemas. A Teoria dos Jogos,
na qual a racionalidade resolve qual decisão é a
melhor, não é apropriada para lidar com este tipo
de situação.
Por exemplo, certa vez dois
economistas pegaram um táxi em um aeroporto.
Preocupados porque a conta seria alta, eles
decidiram não barganhar o preço com o motorista
até que chegassem ao hotel, quando então a posição
de negociação deles seria muito mais forte. Mas
essa estratégia, completamente racional, não
funcionou muito bem. O motorista ficou enfurecido
com a conduta, fechou as portas do carro, os levou
de volta ao aeroporto, e os deixou na rua. Todos
perderam.
O que deu errado? Parece que por
mais que o motorista de táxi não conheça nada
sobre Teoria dos Jogos, ele percebeu que as
pessoas estavam jogando com ele, e não gostou.
Assim, ele fez algo que os cientistas da Teoria
dos Jogos não gostam: ele se enfureceu e agiu,
irracionalmente, contra uma melhor solução para
todos.
Teoria do Drama –
Tais situações, em que as emoções têm um papel
fundamental ativando respostas irracionais, é que
deram origem ao que se chama hoje de Teoria do
Drama. Um dos economistas que estavam no táxi era
Nigel Howard , pai dessa teoria. A Teoria do Drama
não trata as situações descritas nesse texto
apenas como jogos, mas também como situações onde
as convicções e valores das personagens evoluem
com o desenrolar dos enredos. Nela, os jogos não
representam apenas posições estáticas, mas
situações dinâmicas que podem ser totalmente
transformadas pelas emoções dos
jogadores.
A partir desse princípio, e com
uma boa dose de matemática, Howard e seus colegas
identificaram uma série de dilemas que podem
conduzir ao surgimento de diversas emoções em um
drama. Por exemplo, o caso descrito do filme
Matrix envolve uma situação chamada de
dilema da ameaça, no qual Trinity deve induzir
Merovingian a uma determinada solução, utilizando
para isso, uma ameaça irracional. Para ganhar, ela
deve parar de agir racionalmente, e se comportar
como se ela estivesse louca e disposta a enfrentar
qualquer risco. Agindo assim, sua ameaça passa a
ter maior credibilidade.
No caso do
cliente, parece-nos bem racional que ele queira
ganhar. Para fazer isso, ele deve convencer a
empresa que não se desviará de seu objetivo de
trocar de fornecedor, não importando o quanto a
empresa insista em não conceder vantagem
adicional. Vindo de uma pessoa racional, a ameaça
dos clientes é dificilmente crível, logo,
paradoxalmente, a melhor estratégia seria parecer
completamente irracional.
Os modos como as
pessoas reagem nos processos de confronto e de
colaboração estão no coração da Teoria do Drama. A
idéia básica é que esses processos, e os dilemas
neles envolvidos causem um efeito emocional forte
sobre as pessoas. Confrontadas com tal situação,
as emoções emergem. Podendo ser raiva, medo,
benevolência, e até mesmo, como no caso de
Trinity, amor.
Professor Dr. Júlio
Figueiredo Coordenador Acadêmico da
Área de Gestão de Operações da ESPM
|