Artigo:
Reinaldo Azevedo
O
vale-tudo comandado por Lula para tomar São
Paulo
03/03/2012
Para que serve o Ministério
da Pesca e Aquicultura? Serve para garantir
a bênção dos evangélicos
da Igreja Universal à candidatura do
petista Fernando Haddad à Prefeitura
de São Paulo. Simples assim, a presidente
Dilma Rousseff entregou ao bispo Marcelo Crivella
(PRB-RJ) a pasta até agora ocupada
por um petista. Mas o sacrifício deve
valer a pena: além de o PT se livrar
da incômoda gritaria dos evangélicos
da Universal em torno de delicados temas religiosos,
o candidato imposto por Lula ganha a possibilidade
de vir a contar com o apoio do PRB - que,
por enquanto, permanece no páreo, com
o deputado Celso Russomanno num surpreendente
primeiro lugar nas pesquisas de intenção
de voto. Mas isso é mero detalhe. O
que importa é que se escancara o ingresso,
de sola, do Palácio do Planalto na
campanha eleitoral paulistana. E trata-se
apenas do começo.
A cada dia que passa - e estamos
a sete meses do pleito - as impressões
digitais de Lula se tornam mais nítidas
na estratégia eleitoral que tem como
objetivo consagrar a hegemonia do lulopetismo
em todo o País. Para isso é
imprescindível derrotar seus adversários
nos redutos mais importantes que ainda lhes
fazem alguma resistência: a cidade e
o Estado de São Paulo. Este fica para
daqui a dois anos.
Essa estratégia não
vai custar barato para o PT - a senadora Marta
Suplicy e o defenestrado ministro Luiz Sergio
que o digam -, mas Lula já deixou claro
que está disposto a pagar o preço
que for necessário. Cacife não
lhe falta e Dilma Rousseff acaba de comprová-lo,
com a presteza com que se dispôs a entrar
no jogo e procurar o chefão em São
Bernardo para, num encontro de quase três
horas, pedir conselhos e receber novas instruções.
Mas teve que ouvir calada o novo membro do
Gabinete dizer, com inegável senso
de humor, que, embora ministro da Pesca, não
sabe nem colocar minhoca no anzol.
O que não tem a menor importância,
já que essa pescaria nada tem a ver
com peixes.
Toda a encenação
que fez o pano de fundo da triunfante entrada
do bispo Crivella em cena criou em Brasília
uma situação política
tão desfrutável que propiciou
manifestações que foram do deboche
ao puro cinismo. Deste se encarregou a ministra
de Relações Institucionais,
Ideli Salvatti: É a incorporação
efetiva (ao primeiro escalão do governo)
de um aliado. Mas não traremos disputas
locais para o âmbito federal.
Já o senador Cristovam Buarque (PDT-DF),
ex-petista e ex-ministro de Lula, optou pela
zombaria: O governo resolveu pôr
na Pesca um pescador de almas, que ainda vai
andar sobre as águas. Como levar
a sério o que se passa em tal ambiente
político?
O eleitor paulistano pode se
preparar, portanto, para uma das campanhas
eleitorais mais disputadas e extravagantes
da história da cidade, na qual, pelo
andar da carruagem, a ética e os bons
modos certamente acabarão sendo deixados
de lado. As evidências disso se acumulam.
Em manobra rasteira claramente
destinada a cacifar poder de barganha com
o governo, o mensaleiro Waldemar da Costa
Neto, dono do PR, explora a ingenuidade do
folclórico e muito bem votado deputado
Tiririca, lançando-o candidato a prefeito
de São Paulo. O homem já se
sente prefeito do povão.
E o jovem e ambicioso deputado
Gabriel Chalita não faz feio nessa
galharda companhia: depois de transitar por
três partidos em menos de dois anos,
finalmente encontrou um que se dispôs
a lançá-lo a um cargo executivo
e anuncia orgulhoso: Eu tenho uma cara
só.
O saldo desse circo de horrores
é que a cidade de São Paulo,
com todos os graves problemas sociais e urbanos
que aqui se agravam, corre o risco de se tornar
a vítima de uma longa campanha eleitoral
que tende a passar ao largo do debate das
questões que realmente interessam aos
seus mais de 10 milhões de habitantes.
A federalização
do pleito de outubro é inevitável,
e em certa medida até desejável,
porque aqui estará sendo decidido o
futuro político do País a curto
e médio prazos. Mas é preciso
que os candidatos não se esqueçam
de que, apurados os votos, o vencedor terá
de enfrentar a enorme responsabilidade de
governar a cidade.