Quem descobriu o Brasil? Lula
ou Cabral?
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Mudanças como essas não acontecem em curto prazo. A Europa começou a emergir no século XV suplantando a China e o mundo islâmico, até então centros de inovação e poder , mas o processo de sua ascensão se iniciara muito antes, com destaque para a Carta Magna inglesa (1215) e para o Renascimento, que começou no fim do século XIII.
Antes, mudanças ocorreram em áreas cruciais: cultura, sociedade, economia, política e religião. Copérnico, Vesálio e Galileu criaram a ciência moderna, abrindo caminho para o avanço tecnológico. Gutenberg revolucionou a imprensa. Depois, a reforma protestante de Lutero (século XVI) e a Revolução Gloriosa inglesa (1688) se tornaram fonte do moderno sistema capitalista e do predomínio econômico e militar do Ocidente.
Indivíduos à frente de seu tempo contribuíram para mudanças ciclópicas. Entre 1776 e 1787, os pais fundadores da nação americana os que participaram da Declaração de Independência, da Revolução ou da elaboração da Constituição moldaram os princípios formadores dos alicerces sobre os quais se erigiria seu grande futuro.
Felipe González, o governante socialista espanhol (1982-1996), abandonou velhas ideias e conduziu reformas estruturais, incluindo ampla privatização. Preparou seu país para a integração europeia e para longo ciclo de crescimento. Margaret Thatcher reverteu a trajetória de declínio da Inglaterra. Ronald Reagan renovou o capitalismo americano.
O Brasil tem seus líderes transformadores. Entre outros, José Bonifácio, Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek. No período militar, sobressaem Ulysses Guimarães e Tancredo Neves, este em grande parte responsável pelo fim pacífico do autoritarismo.
Ao proclamar-se o início de tudo, o presidente presta um mau serviço à história e aos brasileiros que gostam de ouvi-lo. Despreza o papel de Tancredo Neves na transição para a democracia, sem a qual não teria chegado ao poder. Obscurece a participação de Fernando Henrique Cardoso na construção da plataforma de lançamento da qual decolou.
Lula gostaria de ser lembrado como um Getúlio ou um Juscelino, mas creio que a história a quem cabe apontar o lugar dos atores políticos o reconhecerá pelas corajosas decisões de preservar a política econômica que condenava e de não buscar o terceiro mandato. Evitou, assim, o retorno da inflação e o abalo das instituições políticas, que precisam de tempo para se consolidar.
A continuidade deu tempo para o amadurecimento de mudanças anteriores. Permitiu-nos colher frutos da expansão da economia mundial e da emergência da China, hoje forte demandante de nossas commodities. Crescemos acima da média dos últimos 25 anos. As exportações triplicaram. Com estabilidade, crescimento e baixa inflação, foi possível alargar políticas sociais e assim reduzir as desigualdades sociais e a pobreza.
Lula é um líder de massas sem paralelo na América Latina. Politicamente populista, não foi desastrado na economia, embora deixe más heranças, como o aparelhamento do estado, a piora da qualidade do regime fiscal e os efeitos da inconsequente política externa.
Lula não descobriu o Brasil nem foi um líder transformador, mas não fez o estrago que se temia. Não é pouco. Não precisava, todavia, desconstruir as realizações do passado para marcar seu lugar na história, que parece garantido.
Fonte: Veja