Editorial: O mal a evitar
26/09/2010
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Estadão de Domingo
A
acusação do presidente da República
de que a Imprensa "se comporta como um partido
político" é obviamente extensiva
a este jornal. Lula, que tem o mau hábito
de perder a compostura quando é contrariado,
tem também todo o direito de não estar
gostando da cobertura que o Estado, como quase todos
os órgãos de imprensa, tem dado à
escandalosa deterioração moral do
governo que preside. E muito menos lhe serão
agradáveis as opiniões sobre esse
assunto diariamente manifestadas nesta página
editorial. Mas ele está enganado. Há
uma enorme diferença entre "se comportar
como um partido político" e tomar partido
numa disputa eleitoral em que estão em jogo
valores essenciais ao aprimoramento se não
à própria sobrevivência da democracia
neste país.
Com
todo o peso da responsabilidade à qual nunca
se subtraiu em 135 anos de lutas, o Estado apoia
a candidatura de José Serra à Presidência
da República, e não apenas pelos méritos
do candidato, por seu currículo exemplar
de homem público e pelo que ele pode representar
para a recondução do País ao
desenvolvimento econômico e social pautado
por valores éticos. O apoio deve-se também
à convicção de que o candidato
Serra é o que tem melhor possibilidade de
evitar um grande mal para o País.
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Efetivamente,
não bastasse o embuste do "nunca antes", agora
o dono do PT passou a investir pesado na empulhação
de que a Imprensa denuncia a corrupção que degrada
seu governo por motivos partidários. O presidente Lula tem,
como se vê, outro mau hábito: julgar os outros por
si. Quem age em função de interesse partidário
é quem se transformou de presidente de todos os brasileiros
em chefe de uma facção que tanto mais sectária
se torna quanto mais se apaixona pelo poder. É quem é
o responsável pela invenção de uma candidata
para representá-lo no pleito presidencial e, se eleita, segurar
o lugar do chefão e garantir o bem-estar da companheirada.
É sobre essa perspectiva tão grave e ameaçadora
que os eleitores precisam refletir. O que estará em jogo,
no dia 3 de outubro, não é apenas a continuidade de
um projeto de crescimento econômico com a distribuição
de dividendos sociais. Isso todos os candidatos prometem e têm
condições de fazer. O que o eleitor decidirá
de mais importante é se deixará a máquina do
Estado nas mãos de quem trata o governo e o seu partido como
se fossem uma coisa só, submetendo o interesse coletivo aos
interesses de sua facção.
Não
precisava ser assim. Luiz Inácio Lula da Silva está
chegando ao final de seus dois mandatos com níveis de popularidade
sem precedentes, alavancados por realizações das quais
ele e todos os brasileiros podem se orgulhar, tanto no prosseguimento
e aceleração da ingente tarefa - iniciada nos governos
de Itamar Franco e Fernando Henrique - de promover o desenvolvimento
econômico quanto na ampliação dos programas
que têm permitido a incorporação de milhões
de brasileiros a condições materiais de vida minimamente
compatíveis com as exigências da dignidade humana.
Sob esses aspectos o Brasil evoluiu e é hoje, sem sombra
de dúvida, um país melhor. Mas essa é uma obra
incompleta. Pior, uma construção que se desenvolveu
paralelamente a tentativas quase sempre bem-sucedidas de desconstrução
de um edifício institucional democrático historicamente
frágil no Brasil, mas indispensável para a consolidação,
em qualquer parte, de qualquer processo de desenvolvimento de que
o homem seja sujeito e não mero objeto.
Se
a política é a arte de aliar meios a fins, Lula e
seu entorno primam pela escolha dos piores meios para atingir seu
fim precípuo: manter-se no poder. Para isso vale tudo: alianças
espúrias, corrupção dos agentes políticos,
tráfico de influência, mistificação e,
inclusive, o solapamento das instituições sobre as
quais repousa a democracia - a começar pelo Congresso. E
o que dizer da postura nada edificante de um chefe de Estado que
despreza a liturgia que sua investidura exige e se entrega descontroladamente
ao desmando e à autoglorificação? Este é
o "cara". Esta é a mentalidade que hipnotiza os
brasileiros. Este é o grande mau exemplo que permite a qualquer
um se perguntar: "Se ele pode ignorar as instituições
e atropelar as leis, por que não eu?" Este é
o mal a evitar.
Texto
publicado na seção "Notas e Informações"
da edição de 26/09/2010 -
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