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Artigo: Diogo Mainardi
O retrato do nosso fracasso

"O professor Luizinho é sinal de que a gente se danou. Nunca vamos nos recuperar do espetáculo oferecido ao Congresso Nacional, com o professor Luizinho saltitante, comemorando o seu indulto. É um trauma que jamais poderá ser superado"

Uns países dão certo. Outros não. O Brasil pertence à segunda categoria. Tome-se o professor Luizinho. Ele é o retrato do nosso fracasso. O sinal de que a gente se danou. Nunca mais vamos nos recuperar do espetáculo oferecido ao Congresso Nacional, na última quarta-feira, com o professor Luizinho saltitante, comemorando seu indulto. É um trauma que jamais poderá ser superado. Daqui a trinta ou quarenta anos, quando a economia iraquiana finalmente ultrapassar a brasileira, alguém se lembrará de citar seu caso. Não digo isso pelo professor Luizinho em si. Há professores Luizinho espalhados em todos os cantos do mundo. Tudo bem: um pouco menos pitorescos. Tudo bem: um pouco menos grotescos. Mas há. Há um professor Luizinho no Nebraska. Há um professor Luizinho no Hamas. Há um professor Luizinho no gabinete do ministro dos Transportes ucraniano, que acaba de ser descoberto embolsando uma propina equivalente a 30.000 reais. Ninguém está a salvo dos professores Luizinho, dos Roberto Brant, dos Eduardo Azeredo. O que muda de lugar para lugar é apenas o jeito de lidar com eles.

Eu sei que em tempos de populismo rasteiro não pega bem afirmar algo assim, mas o voto popular não é necessariamente o melhor método para escolher nossos governantes. Eu não escolheria Lula, por exemplo, nem para abrir e fechar o portão da garagem do meu prédio. O seu José é melhor. É mais eficiente. É mais honesto. O eleitor erra. Quase sempre. Em todos os lugares.

O que torna a democracia incomparavelmente superior a todos os outros sistemas não é o método de escolha dos governantes, e sim a possibilidade que ela dá de nos livrarmos deles. Um professor Luizinho pode embolsar 30 000 reais, mas uma democracia sempre irá dispor de mecanismos para puni-lo. Quando esses mecanismos deixam de funcionar, a democracia não serve para mais nada. Ela perde o sentido. Foi exatamente o que aconteceu conosco. O país poderia ter dado certo. Não deu. Pena.

O importante é não se abater com isso. Eu não me abato. Tenho uma receita. Ninguém é tão patologicamente impermeável à realidade quanto eu. Imite o mestre. Minha regra é muito simples: nunca me distancio mais de 800 metros de casa, para um lado ou para o outro. Pouco tempo atrás, eu disse que pagaria para não ter de ir a Cuiabá, mas o fato é que acabei criando minha própria Cuiabá, aqui no Rio de Janeiro. Meu contato com o resto do país é limitado ao que me é mais familiar. Uns quarteirões para cá, uns quarteirões para lá. Recorro também a uma rotina excepcionalmente rígida. De manhã, leio os jornais e as mensagens das "Mainardetes do Orkut". Trata-se de uma página na internet em que algumas leitoras reclamam do meu corte de cabelo. À tarde, levo meu filho mais velho à escola, brinco com o mais novo, penso distraidamente num assunto para a coluna, tiro um cochilo, vou buscar meu filho na escola. Todos os dias, no mesmo horário, o professor Luizinho toca insistentemente a campainha de casa. Eu não abro a porta.



Fonte: Veja Online

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