Adm. de Banco de Dados

Os desafios do Administrador de Banco de Dados

Eduardo Jorge Lapa Lima e Joel Ramos*

Contato pessoal é importante

- Eliminar a possibilidade de se aprender a distância não é o mesmo que ignorar um recurso valioso que a internet pode nos oferecer? O senhor é contra os cursos a distância ou contra os que estão hoje no mercado?

- Minha tese de mestrado é, justamente, sobre uma proposta de se utilizarem as novas tecnologias e o ensino presencial de forma integrada. A idéia é criar um novo ambiente de aprendizado, que alie educação presencial e virtual, sem que o conhecimento seja criado por um grupo restrito de pessoas, de forma centralizada. Só que as empresas de consultoria empresarial chegam a uma corporação e dizem que vão reduzir os custos com treinamento em 80%, porque vão fazer cursos pela internet, em que não é necessário o professor, não são necessárias salas especiais, cada funcionário faz o curso em sua mesa de trabalho etc. Essa linha de argumentação significa que se quer gastar menos dinheiro, para se atingir o mesmo resultado. E não melhorar o resultado gastando menos dinheiro.

- Os cursos pela internet não são mais baratos? Afinal, os recursos são muitos.

- A vice-reitora da Universidade Aberta da Inglaterra, uma das primeiras grandes experiências em educação a distância do mundo, costuma explicar como funcionam seus cursos. Cada dez, quinze alunos têm um monitor, equipes atualizam os conteúdos constantemente, há pessoas que acompanham a trajetória dos alunos pelo curso, enfim, o custo é alto, o mesmo de um curso tradicional.

- Quais são os pontos positivos, afinal, da internet, no que diz respeito à educação?

- A internet é um vasto terreno de pesquisa, de informação, de interação mundial em tempo real. Existem muitos mecanismos de interatividade e trabalho em conjunto. Quando existe um vínculo entre as pessoas, esse trabalho fica interessante. Se não há o vínculo, é um trabalho empobrecido. É interessante começar criando um vínculo pessoal e continuar com um vínculo pela internet. O problema é que, ao se programar um curso de Física, por exemplo, contrata-se uma equipe para pesquisar o conteúdo, redigir um texto, criar ilustrações e figuras, para, depois disso, as pessoas lerem passivamente tudo na tela do computador.

- Recursos como grupos de discussão e contatos com o professor por e-mail não são suficientes para se criar uma interatividade?

- Na verdade, reproduz-se o mesmo paradigma do ensino tradicional, em que se tem o professor responsável pela produção e pela transmissão do conhecimento. Mesmo os grupos de discussão, os e-mails, são, ainda, formas de interação muito pobres. Os cursos pela internet acabam considerando que as pessoas são recipientes de informação. A educação continua a ser, mesmo com esses aparatos tecnológicos, o que ela sempre foi: uma obrigação chata, burocrática. Se você não muda o paradigma, as tecnologias acabam servindo para reafirmar o que já se faz.

- Qual deve ser o ponto de partida de quem vai criar um curso que tenha a internet como meio?

- Quando esses projetos estão nas mãos de consultorias empresariais, de gestão empresarial, em empresas de tecnologia, a ênfase fica na tecnologia, na redução de custos. É uma questão de cultura dessas empresas. O primeiro cuidado a se tomar quando se quer trabalhar com educação a distância pela internet, é refletir sobre o paradigma de educação que vai norteá-lo. É preciso ter, primeiro, uma idéia do curso que se quer oferecer para, depois, pensar na tecnologia necessária para desenvolvê-lo. Deve-se pensar, primeiro, na Educação, não na tecnologia. Quem disse que a internet é a melhor mídia para se ensinar determinada coisa? Talvez a melhor solução para um curso a distância seja uma articulação entre várias mídias: um pouco pela internet, um pouco em papel, um pouco em encontros presenciais, um pouco pela televisão, uma mídia muito poderosa. Há uma série de ações educativas que podem se articular para que se chegue a produtos educacionais interessantes.

- A internet não deve moldar o curso, mas ser um dos meios para realizá-lo...

- Sim. Se você começa pensando ''quero fazer alguma coisa com internet, mas já se faz e-commerce, já se vendem serviços, então, vou fazer educação'', aí, começa a distorção. A maioria das experiências de cursos pela internet, hoje, é ruim. Tem uma qualidade pedagógica, de inovação, ruim. Meu orientador nos Estados Unidos, David Cavallo, costuma dizer que a educação a distância vem reunindo o que há de pior em educação e o que há de pior em distância.

- O que pode ser feito para que se garanta um trabalho de qualidade?

- Nos Estados Unidos, as empresas de e-learning já perceberam que produzir conhecimento não é a mesma coisa que colocar CDs para vender na internet. Então, elas estão se associando a grandes universidades americanas para, exatamente, usar a experiência, o conhecimento, o know-how acumulados em educação que essas universidades têm. Por um lado, isso transforma quem trabalha na universidade, indiretamente, em produtor de conteúdos para cursos online. Há quem critique isso.

- Por quê?

- Vários artigos têm sido escritos sobre isso, por americanos como David Noble, que considera isso uma ''proletarização do trabalho universitário'' e uma ''comoditização do saber universitário''. Pega-se o conhecimento da universidade, o conteúdo dos cursos, o material didático, a experiência dos professores e encapsula-se tudo isso em cursos online. Depois, para o tipo de curso que se cria, acaba-se não precisando de professores tão qualificados. Temos o exemplo, nos Estados Unidos, da Unext, uma grande empresa de educação pela internet, que se associou à Universidade de Chicago e que tem um dos diretores como conselheiro da universidade. Isso gera conflito de interesses. Em várias universidades americanas, professores estão indignados com esses acordos, fazem protestos, manifestos etc. Os termos são desfavoráveis para a universidade.

- Não há aspectos positivos na associação de empresas de e-learning com universidades?

- Quando a empresa se apropria desse material, faz o uso que quiser dele, que deixa de pertencer a uma instituição universitária, para pertencer a uma empresa cujo controle é de acionistas. Na universidade real, seja ela pública ou privada, as pessoas têm acesso ao que está acontecendo, têm acesso ao reitor, têm espaço para trocas, para negociações. Em uma universidade virtual, mal se sabe onde é a sede.

- E isso importa?

- O comércio é universal. Pode-se vender um sabonete no Brasil, nos Estados Unidos. Mas a educação não é universal; é local, integrada à cultura local. Em um curso de Tecnologia Aeroespacial online, por exemplo, pode-se ter certeza de que pontos mais avançados e estratégicos da tecnologia aeroespacial que as pessoas que estudam nos Estados Unidos, no Laboratório do MIT (Massachussets Institute of Technology) vão aprender ali, não serão incluídos no curso a distância. É um produto para exportação. Todos os produtos que o Brasil importa, se comprados no local onde são fabricados, em geral, são melhores. Só que uma coisa é você comprar um CD americano. Outra coisa é comprar um curso online.

- O ensino via internet pode não despertar o interesse das empresas apenas por ser apresentado como um treinamento mais barato, mas por oferecer as vantagens de um recurso, pleno de agilidade, com o qual nunca se havia contado antes...

- Há um projeto interessante de educação a distância da Petrobrás, há muitos anos, para propiciar o acesso a cursos a pessoas que nunca poderiam sonhar com isso e que estão em diferentes pontos do país. Mas é um processo extremamente caro. Existem outras experiências, e não são novos. Entretanto, o que muitos querem, hoje, é a fórmula mágica, uma fábrica de cursos pela internet, uma produção em série. Querem se apropriar do conhecimento universitário e empacotar para viagem. A universidade deve questionar esse processo. Senão, a educação presencial será cada vez mais elitista e cara. E a educação a distância, um produto mais barato, de menor qualidade, para quem não puder pagar o outro. Esse é o grande perigo: reproduzir e aprofundar uma estrutura social perversa no uso das novas tecnologias.

Entrevista - Paulo Blikstein

Fonte: JBOnline


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