Johann Friedrich Karl Benz Gauss (1777 - 1855)
O princípe dos matemáticos
Matemático, astrônomo e físico alemão (30/4/1777-23/2/1855), criador da geometria diferencial.
Nasceu a: 30 de Abril de 1777, em Brunswich, na Alemanha Morreu a: 23 de Fevereiro de 1855, em Göttingen, na Alemanha
Cientista alemão , Carl Friedrich Gauss nasceu em Brunswich, na Alemanha e morreu em Göttingen, na Alemanha. Estudou na Universidade de Göttingen de 1795 a 1798, onde passou a ensinar Matemática a partir de 1807, sendo ao mesmo tempo diretor do Observatório Astronômico pertencente àquela Instituição. Manteve ambos os cargos até à sua morte. Gauss dedicou-se à matemática, à astronomia, à geodesia, à física-matemática e à geometria. O seu nome consta de numerosos resultados obtidos nos domínios da astronomia, da física e da matemática. Nestas áreas, Gauss demonstrou a denominada lei fundamental da álgebra, segundo a qual uma equação do segundo grau tem duas soluções, uma do terceiro tem três e assim sucessivamente. Para tratar medidas astronômicas desenvolveu o método dos mínimos quadrados . Com este sistema conseguiu calcular em pouco tempo, e com grande exatidão, as órbitas dos corpos celestes, a partir de poucas observações. Obteve ainda as chamadas coordenadas de Gauss - utilizam-se especialmente para a determinação de um ponto sobre a superfície da Terra (latitude e longitude); a curva de Gauss - curva da distribuição normal mediante a qual é possível representar-se medidas prováveis da Estatística; o método de eliminação de Gauss - utiliza-se na análise numérica para resolver sistemas de equações lineares; e o plano de Gauss - plano para representação dos números complexos.
Vida
Filho de um trabalhador do campo, foi criado no seio de uma família pobre, austera e sem educação. Dadas as precárias condições econômicas da sua família, recebeu o precioso apoio do Duque de Brunswich que reconheceu nele uma criança-prodígio. Este apoio começou quando Gauss tinha 14 anos e permitiu-lhe dedicar-se exclusivamente aos estudos, durante 16 anos.
Ainda antes do seu vigésimo quinto aniversário, já Gauss era famoso pelo seu trabalho em Matemática e Astronomia. Aos 30 anos foi nomeado Diretor do Observatório de Göttingen, cidade da qual raramente saiu, exceto por questões científicas. Aí, trabalhou durante 48 anos (de 1807 a 1855) até à sua morte, com quase 78 anos.
A vida pessoal de Gauss foi trágica e complicada. Um pai insensível, a morte prematura da sua primeira mulher, a pouca saúde da sua segunda mulher e uma terrível relação com os seus filhos negou-lhe, até tarde, a possibilidade de vida estável no seio de uma famíla equlibrada.
Mesmo com todos estes problemas, Gauss manteve uma rica e espantosa atividade científica. A sua precoce paixão pelos números e cálculos estendeu-se à Teoria dos Números, à Álgebra, à Análise, à Geometria, à teoria das Probabilidades e à Teoria dos Erros. Ao mesmo tempo, levou em frente uma intensiva pesquisa empírica e teórica em muitos outros ramos, incluindo Astronomia Observacional, Mecânica Celeste, levantamento topográfico, Geodesia, Geomagnetísmo, Electromagnetísmo e Mecanismos Ópticos.
***
Gauss não encontrou nenhum colaborador
entre os seus colegas matemáticos tendo
trabalhado sempre sozinho. Mas, se é
verdade que o seu isolamento relativo, a sua
compreensão das matemáticas
«puras» e «aplicadas»,
a sua preocupação com a astronomia
e o uso frequente que faz do latim têm
a marca do século XVIII, é inegával
que, nos seus trabalhos, se reflete o espírito
de um novo período. Se, tal como os
seus contemporâneos Kant, Goethe, Beethoven
e Hegel, se manteve à margem das grandes
lutas políticas da sua época,
a verdade é que, no seu próprio
campo, Gauss expressou as novas ideias da
sua época de uma forma poderosíssima.
As suas publicações, a sua abundante
correspondência, as suas notas, e os
seus manuscritos mostram que ele possuía
uma das maiores virtuosidades científicas
de todos os tempos.
Antepassados e Ambiente Familiar
Nem na descendência de Gauss, nem no seu ambiente infantil, existe qualquer indício do que viria a ser o trabalho da sua vida.
Do lado de seu pai, temos sobretudo donos de pequenas quintas, trabalhadores rurais e operários em Braunschweig (que é agora uma parte da ex-Alemanha de Leste), isto é, trabalhadores que lutavam arduamente pela sua subsistência. Contudo, há também notícia de agricultores abastados, pedreiros e titulares de postos eclesiásticos.
O avô paterno, Jürgen Goos, estabeleceu-se na cidade de Braunschweig (mais tarde, capital do Ducado de Braunschweig) em 1744. Seu pai, Gebhard Dietrich Gauss, nasceu em 1744. Finalmente, e após muito trabalhar como pedreiro, construtor de canais e jardineiro, Gebhard tornou-se proprietário de uma casa, em Wilhelmstrasse, que havia sido comprada por seu pai, Jürgen Goos, em 1753, com uma elevada hipoteca. Como Gebhard calculava e escrevia bem, foi-lhe confiado a função de tesoureiro de um fundo de enterro. A primeira mulher de Gebhart morreu em 1775. No ano seguinte, Gebhart casou com Dorothea Benze. O único filho desta união foi Carl Friedrich Gauss, que nasceu a 30 de Abril de 1777, na casa de Wilhelmstrasse (que mais tarde se tornou um museu e foi destruída num bombardeamento durante a Segunda Guerra Mundial).
O avô materno de Gauss, Kristoffer Benze,
era pedreiro na aldeia de Velpke, nos arredores
de Braunschweig. Como trabalhava no arenito,
seus pulmões foram afetados, acabando
por morrer quando tinha apenas trinta anos.
O irmão mais novo de Dorothea, Johann
Friedrich, era dotado, original e autodidata,
tendo aprendido por si próprio a ser
um bom tecelão de damasco. Quando morreu,
em 1809, Gauss declarou que o mundo havia
perdido um gênio, declaração
esta que só tem a evidência do
olhar de Gauss como sustentação.
Quanto à sua mãe, Dorothea, nunca aprendeu a escrever e quase não conseguia ler. No entanto tinha uma ótima inteligência, bom humor e um forte carater. O seu filho Carl Friedrich foi o seu interesse dominante da sua vida cujas últimos vinte e dois anos dedicou a acompanhar o filho no observatório, em Göttingen.
Em 1810 Gauss descrevia os seus pais numa carta para Minna Waldeck (que se tornou a sua segunda esposa) nas seguintes palavras:
"O
meu pai era um homem absolutamente honesto,
em muitos aspectos merecedor de respeito,
e certamente um homem bem visto. Mas na sua
casa era tirânico, grosseiro, e violento...
Nunca teve a minha confiança completa
quando eu era uma criança. No entanto,
creio que nenhuma influência dele se
faz realmente sentir em mim, dado que me tornei
independente muito cedo...
A minha mãe nasceu a cinquenta quilómetros
de Braunschweig, e lá trabalhou durante
alguns anos como empregada. Casou com o meu
pai em 1776, e não houve mais crianças
além de mim. O seu casamento não
foi feliz o que ficou a dever-se a circunstâncias
exteriores e ao fato das duas personalidades
não serem compatíveis. A minha
mãe é certamente uma mulher
muito boa, que não é indigna
do amor do seu filho."
A Infância
O Prodígio Matemático
Começaram cedo os indícios que faziam adivinhar o talento incrível que Gauss demonstraria ao longo de sua vida. Isso é patente em alguns dos excertos que relatam a sua infância. É o caso do seguinte episódio: durante os verões, Gebhard Gauss, que era contramestre numa firma de alvenaria, pagava o salário semanal aos seus trabalhadores. Uma vez, quando Gebhard estava prestes a pagar o salário a um dos trabalhadores, Carl Friedrich, na altura com apenas três anos, levantou-se e disse: "Papa, cometeste um erro!", indicando em seguida a quantia certa. Gauss tinha seguido os cálculos sem sequer poder ver os registos escritos (dado que a sua altura ainda não era suficiente para alcançar a mesa), e para surpresa dos presentes, uma confirmação provou que Carl Friedrich estava certo.
É portanto natural que Gauss tivesse o costume de dizer que tinha aprendido a contar e a calcular antes de ter aprendido a falar.
Outra das suas proezas foi aprender a ler sozinho. Como o conseguiu? Segundo reza a história apenas perguntando aos adultos como se pronunciavam as letras do alfabeto. E isto foi só o início do que viria a ser a sua obra.
A Educação
Carl Friedrich tinha sete anos quando entrou para a Escola Primária St. Catherine, sendo inicialmente apenas mais um no meio de tantos alunos. O seu professor era J.G. Büttner, um professor tradicional que, em geral, considerava os seus alunos como incapazes e pouco dotados. No entanto, cedo descobriu que Gauss era diferente. Como o descobriu? Quando o seguinte episódio aconteceu:
Gauss tinha cerca de dez anos e frequentava a classe de aritmética quando Büttner propôs o seguinte difícil problema:
"Escrevam todos os números de 1 a 100 e depois vejam quanto dá a sua soma."
Era hábito, quando a classe tinha uma
tarefa deste tipo, que se fizesse o seguinte:
o primeiro aluno a acabar iria até
à secretária do professor com
a sua ardósia e colocá-la-ia
em cima da mesa. O seguinte a acabar colocaria
a sua ardósia em cima da do colega
e assim sucessivamente, até a pilha
de ardósias estar completa.
O problema em questão não era
difícil para alguém que tivesse
alguma familiaridade com as progressões
aritméticas. Como os rapazes ainda
eram principiantes, Büttner certamente
pensou que lhe seria possível fazer
um intervalo por um bom bocado. Mas estava
enganado... Em alguns segundos, Gauss colocou
a sua ardósia na mesa, e ao mesmo tempo
disse no seu dialecto Braunschweig: "Ligget
se" (Aqui jaz ). Enquanto os outros alunos
continuavam a somar, Gauss sentou-se calmo
e sereno, impassível aos olhares desdenhosos
e suspeitos de Büttner.
No final da aula os resultados foram examinados.
A grande maioria dos alunos tinha apresentado
resultados errados pelo que foram severamente
corrigidos com uma cana-da-índia. Na
ardósia de Gauss, que se encontrava
no fim, estava apenas um número: 5050
(É desnecessário dizer que o
resultado esta correcto.) Como seria de esperar,
Gauss teve que explicar ao espantado professor
Büttner como é que tinha obtido
aquele resultado:
"Então, 1+100=101, 2+99=101, 3+98=101, e por ai em diante, até finalmente 49+52=101 e 50+51=101. Isto dá um total de 50 pares de números cuja soma dá 101. Portanto, a soma total é 50101=5050."
Desta maneira aparentemente simples, Gauss tinha encontrado a propriedade da simetria das progressões aritméticas, derivando a fórmula da soma para uma progressão aritmética arbitrária – fórmula que, provavelmente, Gauss descobriu por si próprio.
Este acontecimento marcou o ponto de viragem
na sua vida. Büttner imediatamente percebeu
que pouco mais tinha para ensinar a Gauss
e deu-lhe o melhor livro escolar de aritmética,
especialmente encomendado de Hamburg. Por
essa altura, Gauss teve um estreito contacto
com Martin Bartels, na altura com 18 anos,
assistente de Büttner nas aulas o que
constituiu um golpe de sorte, não tanto
para Gauss que pouco tinha a aprender com
ele mas para Bartels que, mais tarde, se tornou
professor de Matemática.
Perante este génio, tanto Büttner como Bartels visitaram o pai de Gauss para lhe falarem da educação do seu filho. Gebhard estava habituado a que a sua vontade fosse lei na família e havia idealizado que os seus dois filhos seguissem os seus passos (o que, de facto, aconteceu com o meio irmão de Carl Friedrich, George, fruto do primeiro casamento de seu pai). Inicialmente Gebhard mostrou-se relutante e perguntou-lhes (com razão) como é que iria arranjar dinheiro suficiente para subsidiar a educação superior do seu filho. A isto Bartels e Büttner responderam com o único argumento que era habitual e, frequentemente, o único possível, nesses dias: "Não temos dúvida que arranjaremos qualquer pessoa distinta que queira sirvir de patrono a um tal génio."
O resultado foi um compromisso... Gebhard
permitiu que o rapaz abandonasse o seu trabalho
de rotina fiando linho. A roca de fiar desapareceu
(Gebhard disse que havia feito dela lenha
para a lareira) e, no seu lugar, apareceram
livros.
Gauss e Bartels passaram então a trabalhar
juntos. Costumavam sentar-se e discutir problemas
de Matemática até longas horas
da noite. Mas cedo Bartels compreendeu que
nada tinha para ensinar a Gauss. O aluno tinha
superado o mestre.
Em 1788, Gauss matriculou-se (quase contra
a vontade do pai) no Liceu Catharineum em
Braunschweig.
O Professor Hellwing devolveu o primeiro trabalho
escrito de Gauss com o comentário de
que "não era necessário,
para um estudante tão dotado, continuar
a ter aulas naquela classe".
Com a ajuda de Bartels e do filólogo
Meyerhoff, Gauss depressa ultrapassou os seus
colegas, não só em Matemática
como também nas línguas clássicas.
No entanto, para que fosse possível
continuar a sua educação, e
terminado o período de frequência
neste colégio, era necessário
dinheiro, coisa que Gauss não tinha.
É então que...
O Duque Ferdinand Torna-se Seu Benfeitor
Através de Bartels, Gauss, entrou em contacto com o Professor Zimmermann no Colégio Carolinum (que mais tarde se tornou um Instituto Técnico). Este era conselheiro particular do Duque Ferdinand e viria a ser o intermediário entre Gauss e o seu benfeitor, o reinante Duque Carl Wilhelm Ferdinand, da casa de Braunschweig. Mais tarde, de forma a formalizar o apoio dado pelo Duque, Gauss foi convocado para uma audiência pelo Tribunal Oficial na qual tudo correu bem. Aí o Duque comprometeu-se a fornecer os meios necessários "para a continuação da preparação de uma pessoa tão dotada".
O Duque tinha ganho de uma vez por todas a confiança e a devoção do tímido jovem de 14 anos.Com os problemas económicos resolvidos, era suposto que o pai de Gauss não tivesse mais nada a dizer contra o facto do seu filho continuar a estudar.
Gauss frequentou o Colégio Carolinum
durante os anos 1792-1795. Quando lá
chegou, possuía uma educação
clássica e científica muito
para além do que era habitual naquele
tempo, em pessoas tão jovens.
Em 1796, quando Gauss publicou a sua primeira
notícia científica (sobre o
polígono regular de 17-lados), Zimmermann
apresentou-o ao círculo de leitores
com algumas linhas:
"aqui em Braunschweig devotou-se ele próprio à filosofia e à literatura com o mesmo sucesso que na álgebra superior."
Primeira Pesquisa Independente. Os Números Primos e a Hipótese de Gauss Respeitante à sua Distribuição.
Antes que um matemático maduro seja capaz de dar qualquer contribuição para a sua ciência, terá primeiro que conhecer a fundo os resultados que as gerações anteriores já alcançaram. Existem várias formas de o fazer: usando um livro escolar, recebendo o apoio um professor ou pensando por si só. Durante a sua infância, Gauss pôde utilizar a primeira e a segunda destas possibilidades, embora com limites muito estreitos. Porém, tendo em conta a sua genialidade, é natural que tenha usado a terceira hipótese na maioria das vezes. Assim, aconteceu-lhe com grande frequência redescobrir teoremas que já eram conhecidos, por exemplo, a fórmula da soma de uma progressão aritmética.
Tal como todas as outras crianças, Gauss começou os seus estudos matemáticos pelos números naturais 1, 2, 3, 4, ... Sabemos que, apesar de parecerem simples, estes números escondem muitos dos mais difíceis problemas matemáticos, por exemplo, em torno dos números primos.
Ora, com apenas 15 anos, isto é, durante o ano 1792-1793, Gauss investigou a distribuição dos números primos. A única ajuda que teve foi uma tabela de números primos publicada pelo suíço Johann Lambert. Gauss dividiu os números naturais em milhares (de 1 a 1000, de 1000 a 2000 e por aí em diante) e usou a tabela de Lambert para calcular o número de primos em cada intervalo, isto é, determinou (1000), (2000)-(1000) e assim sucessivamente. Na tabela seguinte, que apenas mostra o início, estão as diferenças que medem a taxa de crescimento dos número primos denotadas por D(x).
x |
(x)
|
D(x) |
1000 |
168 |
168 |
A tendência de D(x) para decrescer devagar à medida que x aumenta aparece já aqui e esta tendência permanece à medida que a tabela vai sendo aumentada. Para a maior parte, o seu crescimento continua a uma razão cada vez mais lenta, sem contudo parar completamente. O que implica que os números primos se tornam mais escassos à medida que progredimos nos números naturais.
Esta propriedade geral dos números primos já era conhecida e, como é relativamente trivial, não importa se foi ou não Gauss que a descobriu por si só. Mas o que se segue não é trivial. Ao investigar diferentes tipos de funções Gauss depressa descobriu que na média D(x) era inversamente proporcional ao logaritmo natural de x, que se escreve log x.
Como ele havia descoberto uma expressão para D(x), podia determinar uma expressão para (x) por um processo de soma intimamente relacionado com os integrais em Matemática.
O jovem Gauss, com apenas 15 anos, apresentou a sua hipótese sobre a distribuição de números primos na forma de integral: o número de primos que são menores ou iguais ao número natural x é aproximadamente dado por
Na sua pesquisa da teoria dos números, e provavelmente noutras áreas do seu trabalho, Gauss começou com os números. Ele experimentou-os, combinando-os de inumeráveis maneiras em cálculos numéricos (houve quem dissesse que brincava com eles) e durante essa brincadeira encontrou, empiricamente, relações e leis cujas demonstrações rigorosas lhe custaram grandes esforços.
As investigações de Gauss sobre a distribuição de números primos marcaram os seus quinze ou dezasseis anos de transições do que ele próprio mais tarde chamou "a pesquisa mais subtil na aritmética superior" (o que nós agora chamamos teoria dos números). O seu método indutivo permitiu aí os maiores triunfos quando descobriu o Teorema Fundamental dos Resíduos Quadráticos, em Março de 1795, a que chamou Theorema aureum- teorema dourado - e Gemma Arithmeticae - gema da aritmética.
O baptizado poético dos seus novos teoremas talvez pareça hoje estranho aos nossos ouvidos. Mas Gauss viveu durante um período que, do ponto de vista da literatura, era dominado pelo romantismo. Trata-se de um estilo que Gauss seguiu nas suas cartas privadas e testemunhos e que por vezes invade o seu trabalho matemático.
As metáforas românticas que usa quando compara os teoremas matemáticos ao ouro e a pedras preciosas ou quando diz: "Matemática é a rainha das ciências, mas a Aritmética é a rainha das Matemáticas" são espelho disso mesmo.
Curiosamente, a metáfora revertia sobre o próprio Gauss que era designado como Príncipe das Matemáticas.
Em 1791, Gauss começou a sua investigação
dos meios aritmético-geométricos.
Já em 1792, quando tinha quinze anos,
havia começado a ponderar os fundamentos
da Geometria Euclidiana. Estava já
interessado no famoso axioma das paralelas
e as suas ideias, mais tarde amadurecidas,
deram origem à Geometria Não-Euclidiana.
Ao longo dos anos, na sua correspondência,
é possível verificar que, cautelosamente
mas de forma cada vez mais clara, a sua certeza
aumenta em relação ao facto
de o Quinto Postulado de Euclides não
ser demonstrável.
Em 1794 Gauss descobriu a relação entre este valor médio e certas séries de potências. Ainda no mesmo ano descobriu o Método dos Mínimos Quadrados, tendo também estudado como trabalhar com erros observáveis, o que mais tarde o levaram à curva Gaussiana dos erros.
Os Primeiros Anos Universitários
O Polígono Regular de 17 Lados
No dia 15 de Outubro de 1795, Gauss foi admitido
na Universidade de Göttingen como "matematicamente
culto"; isto é, como um estudante
de Matemática. Contudo é muitas
vezes assinalado o facto de, de início,
Gauss, ter estado indeciso entre tornar-se
Matemático ou Filólogo.
O geólogo Sartorius von Waltershausen,
um amigo intimo de Gauss nos seus últimos
anos disse que Gauss terá ficado completamente
certo da sua escolha quando descobriu a construção
do polígono regular de 17 lados, ou
seja, após o primeiro ano na universidade.
Dos professores em Göttingen, quem mais impressionou Gauss foi o grande filólogo e classicista Christian Gottlob Heyne, a cujas aulas assistiu inicialmente e o matemático Abraham Gotthelf Kästner, que mostrou pouco interesse pela pesquisa de Gauss.
A Biblioteca requisitada por Gauss durante o primeiro ano em Göttingen é surpreendente. Como estudante no Colégio Carolinum ele tinha estudado Newton, Euler, e Lagrange provavelmente de forma profunda, e seria natural para ele que continuasse por essa linha. Mas, dos vinte e cinco livros que ele requisitou da Biblioteca, apenas cinco eram de Matemática, sendo os restantes de autores humanistas. Quer isto dizer que as humanidades continuariam como o seu passatempo preferido...
De qualquer modo, aos dezoito anos Gauss teve um vislumbre das suas ideias matemáticas. Sabêmo-lo através do seu jornal cientifico, escrito em latim, a que deu o nome de Notizenjournal.
Na edição de 30 de Março de 1796, escreve:
"Princípio da divisão do círculo, como dividir geometricamente uma circunferência em dezassete partes, e daí em diante."
Foi esta descoberta que, com um simples golpe,
fez Gauss famoso entre os Matemáticos.
Ela envolve a construção do
polígono regular de 17 lados usando
apenas "as ferramentas de Euclides",
isto é, régua e compasso.
Gauss ficou tão feliz e orgulhoso com
esta descoberta que disse ao seu amigo Wolfgang
Bolyai que o polígono regular de 17
lados deveria ser gravado na sua sepultura.
Não chegou a ser. Mas, no monumento a Gauss, em Braunschweig, existe uma estrela de 17 pontas que quase se confunde com uma circunferência.
A primeira noticia publicada com que Gauss apareceu em público dá a retrospectiva histórica do problema.
"Todo
o principiante em Geometria sabe que é
possível construir diferentes polígonos
regulares, por exemplo, triângulos,
pentágonos, polígonos regulares
com 15 lados, e que esses polígonos
são resultantes de se duplicar o número
de lados dessas figuras. Parte disto já
vem do tempo de Euclides e parece que, desde
então, se acreditou que o campo da
geometria elementar acabou nesse ponto. Em
todo o caso, não conheço nenhuma
tentativa bem sucedida para estender as fronteiras
para além dessa linha.
Parece-me portanto que esta descoberta possui
algum interesse especial. Na verdade, para
além desses polígonos regulares,
um número de outros são geometricamente
constructíveis, por exemplo, o de 17
lados. Esta descoberta é realmente
um corolário de uma teoria com conteúdos
maiores, que ainda não está
completa, mas que será publicada assim
que for completada."
O Jornal. A Reclamação de Gauss por um Resultado Matemático.
O
jornal de Gauss só foi fundado em 1898.
Desempenhou um papel importante na apreciação
da sua contribuição matemática
dado que contém muita coisa que Gauss
nunca publicou ou a que apenas havia feito
alusão em cartas para os seus amigos.
É uma brochura de dezanove páginas
impressas em oitavo, cobrindo o período
de 30 de Março de 1796 a 9 de Julho
de 1814. Ao todo, existem 146 pequenos registos
de descobertas, resultantes de cálculos
numéricos ou simples afirmações
de teoremas matemáticos.
O jornal dá-nos uma visão clara
do percurso matemático de Gauss quando
este tinha entre 18 e 24 anos, isto é,
durante os anos significativos de 1796-1801.
De todos os registos, 121 deles caem neste
intervalo. Assim, de forma lacónica,
podemos seguir o fio de grandes descobertas
em Álgebra, Análise e Teoria
dos Números.
No jornal, Gauss teve que pôr de lado a máscara de cautela e inacessibilidade que sempre mostrou ao mundo que o rodeou durante toda a sua vida. A sua alegria e orgulho surgem em exclamações triunfantes. "Felicitas nobis est facta" (fui bem sucedido) fecha a noticia de 3 de Junho de 1800, quando descobriu a mais bela propriedade das funções modelares elípticas. Expressões semelhantes apareceram várias vezes. Elas são reminiscências da "Eureka" de Arquimedes, grito triunfante das descobertas ao longo dos anos.
Apesar de lacónicas, as notícias no jornal revelam alguma coisa da individualidade de Gauss: rica ingenuidade combinada com competência numérica e poder lógico para encontrar as demonstrações exactas, depois de longo e laborioso trabalho.
Como explicar esta sua reserva?
Tal como Mozart, supõe-se que Gauss tenha sido esmagado por uma enchente de novas ideias, durante a sua juventude. As introduções no jornal eram feitas em Latim e, provavelmente, era intenção de Gauss pô-las de forma mais detalhada posteriormente. Mas, em muitos casos, Gauss nunca publicou as suas descobertas, as quais foram recuperadas das notas ou das cartas que deixou.
Tal como Newton, que Gauss admirava muitíssimo (nquanto que outros matemáticos são rotulados com epítetos tais como "clarissimus" (altamente distinguíveis), Newton é "summus" (o melhor)), Gauss adicionou à exigência de rigor e forma clara outra característica: a exigência de síntese. Ele queria encontrar uma teoria uniforme e geral em cada área que estabelecesse as ligações entre os diferentes teoremas. Quer isto dizer que, tal como Newton, Gauss desejou deixar uma obra de arte completa na qual nada pudesse ser modificado sem que se destruísse a harmonia do conjunto. Mas, tal como Newton, Gauss queria obter uma posição social segura e, apesar do Duque Ferdinand o apoiar, Gauss queria sustentar-se a ele próprio. O posto de chefe no Observatório Astronómico em Göttingen permitiu-lhe alguma independência económica em 1807.
Mais uma razão para a sua reserva pode ser encontrada no próprio caracter de Gauss que detestava todas as formas de violência e encarava as explosões impetuosas como algo vergonhoso. Provavelmente, esta atitude era uma reacção contra o seu pai tirânico. Gauss sempre teve um profundo desagrado por polémicas e quis proteger a paz de espírito no seu trabalho. Nunca tomou parte em nenhum debate público apesar de ser conhecida a perspicácia da sua crítica em discussões privadas com os amigos.
Estas são algumas das causas que podem permitir explicar porque razão tantas descobertas brilhantes nunca foram publicadas por Gauss. A mais importante é, certamente, a sua exigência de rigor, beleza, e síntese. Exigências que encontram expressão magnífica na obra de Gauss.
A Sua Amizade com Wolfgang Bolyai. O TeoremaFundamental da Álgebra. Gauss como um Rigorista.
Desde a infância, provavelmente devido ao seu estatuto de prodígio, e talvez também devido à sua disposição séria, Gauss isolou-se dos seus contemporâneos. Esta solidão continuou durante os primeiros anos em Göttingen. Gauss não participava na vida estudantil e tinha poucos amigos.
Entre os seus poucos amigos estava o húngaro Wolfgang Bolyai (1775-1856). Bolyai estudou em Göttingen durante 1796- 1799 e mais tarde tornou-se professor de Matemática em Maros (Vásárhely) na Transilvânia.
Gauss dizia que Bolyai era o único que tinha o mesmo ponto de vista que ele em relação aos fundamentos da Matemática. Por seu lado, Bolyai terá dito a Dorothea que o seu filho era "o maior Matemático da Europa" .
Gauss e Bolyai trocaram cartas durante mais de cinquenta anos, desde 1797 até 1853. Cartas que dão uma imagem viva da fiel amizade que Gauss, apesar do seu temperamento frio, era capaz de abrigar dentro do seu coração.
A 16 de Julho de 1799, Gauss foi graduado Doutor em Filosofia pela Universidade de Helmstedt. A sua tese, publicada nesse mesmo ano, sob o título Demonstratio nova theorematis omnem functionem algebraicum rationalem integram unius variabilis in factores reales primi vel secundi gradus resolvi posse (Uma nova demonstração de que todos os polinómios de uma variável podem ser factorizados em factores reais de primeiro e segundo grau), é uma demonstração do Teorema Fundamental da Álgebra.
O Teorema Fundamental da Álgebra pode enunciar-se de forma geral: Toda a equação polinomial tem pelo menos uma raiz. O facto de uma equação polinomial de grau n ter sempre n raízes é então um simples corolário.
As diferentes demonstrações deste teorema são as contribuições mais importantes que Gauss deu como rigorista, isto é, como representante do rigor lógico nos métodos demonstrativos. Como este teorema tem grande significado tanto em Álgebra como em Teoria de Funções, ele influenciou ambas as áreas. Mas o estímulo do rigor veio sobretudo da Teoria das Funções.
Disputationes arithmeticae
As ideias que fluíram de Gauss durante os anos frutuosos de 1795-1801 foram, na sua maioria, reunidas num trabalho que publicou em Leipzig em 1801, Disputationes arithmeticae.
A impressão foi paga pelo Duque Ferdinand razão pela qual o trabalho começa com uma dedicatória a "Sua Graciosa Alteza, Príncipe e Lorde Carl Wilhelm Ferdinand, Duque de Braunschweig e Lüneburg." Entre outras coisas, Gauss declara que, sem a bondade do Duque, "nunca teria conseguido dedicar-me à Matemática, na qual tenho estado sempre mergulhado com apaixonado amor." Esta dedicatória é fortalecida pelo estilo rocócó que era usado na altura mas, neste caso, não estamos perante uma bajulação vazia de sentimento. Estas palavras reflectiam aquilo que Gauss sentia.
As Disquisitiones arithmeticae estão divididas em sete partes:
Congruências em geral
Congruências de primeiro grau
Resto de Potências
Congruências de segundo grau
Formas quadráticas
Aplicações
Divisões do círculo
Apresentamos em seguida apenas um esboço do conteúdo das Disquisitiones arithmeticae que, com propriedade, podem ser consideradas como uma sinfonia clássica em sete momentos, onde os diferentes temas são combinados num final que é levado a cabo com grande força e magnífica clareza.
Congruências em Geral e Congruências de Primeiro Grau
Na primeira página Gauss introduz um novo símbolo matemático e diz que:
Se um número m divide a diferença a-b (ou b-a) de dois números a e b sem resto, então a e b dizem-se congruentes módulo m, e Gauss escreveu
Esta expressão lê-se: a é congruente com b módulo m. A relação é chamada congruência; e m é chamado de módulo da congruência. O número b é chamado o resto de a módulo m, e inversamente a é chamado o resto de b módulo m. Se a diferença a-b não for divisível por m, então a e b dizem-se incongruentes módulo m, e a e b não são restos um do outro, módulo m.
De acordo com a definição, é o mesmo que a-b=my, onde y é um número inteiro qualquer.
Gauss escolheu o símbolo com grande previdência, dada a analogia entre congruências e igualdades. A noção de congruência é mais inclusiva, dado que podemos considerar a igualdade uma congruência de módulo 0.
Na segunda secção do seu Disquisitiones
arithmeticae Gauss primeiro provou alguns
teoremas donde saiu aquele que usualmente
é chamado o Teorema
Fundamental da Aritmética:
Todo o número natural maior que 1 pode,
exceto pela ordem dos fatores, ser escrito
de uma e uma só maneira como produto
de números primos.
Usando o teorema fundamental da álgebra Gauss depois determinou o máximo divisor comum (a,b) e o mínimo múltiplo comum {a,b}, de dois números a e b.
O resultado de Gauss para a solubilidade das
congruências lineares é:
Se (a,m)=d, então é condição
necessária e suficiente para que a
congruência seja
solúvel que d seja um divisor de b.
Então logo existem d diferentes sequências
de soluções, ou seja, d soluções.
Congruências de Segundo Grau
Na terceira e na quarta secções
Gauss continuou com as congruências
de grau superior. Especialmente importante
é a congruência binomial .
Se p é um número
primo e a é um número
inteiro qualquer não divisível
por p, então .
A quarta secção refere-se a
uma das mais interessantes partes da teoria
dos números, a teoria dos restos quadráticos.
Um número a é chamado um resto
quadrático do número m
se a congruência tiver
solução. Se a congruência
não tiver solução, então
a não é um
resto quadrático de m.
Ao computar o período inteiro da expansão decimal de 1/n desde n=1 até n=1000, Gauss escreveu uma tabela para descobrir a relação entre o período da expressão decimal e o denominador n.
No dia 8 de Abril de 1796, uma pequena noticia no jornal afirma que ele havia descoberto a demonstração exacta do teorema fundamental dos restos quadráticos. Esta era uma demonstração muito longa, que continha oito casos diferentes e era carregada de lógica obstinada. O grande matemático alemão Leopold Kronecker (1823-1891) mais tarde caracterizou-a como "um teste de força ao génio de Gauss".
A lei da reciprocidade quadrática pode ser formulada de várias maneiras. A mais curta é provavelmente a seguinte:
O número primo p é um erro quadrático ou não é um erro de outro número primo p de acordo com ser um erro ou não de p.
Formas Quadráticas
Na quinta secção Gauss primeiro manuseia a forma binária quadrática, isto é, uma expressão da forma . Aqui o problema é determinar as soluções inteiras de x e y da equação Diofantina =m, onde a, b, c e m são números inteiros dados. Depois ele estudou o problema correspondente para a forma ternária quadrática, isto é, uma expressão da forma .
Na sexta secção a precedente teoria é aplicada a um número especial de casos, tais como às soluções de números inteiros da equação diofantina .
A Divisão do Circulo.
Na sexta e última secção Gauss aplica os resultados anteriores à congruência binomial onde p é um número primo e n é um número natural. A relação entre estas congruências aritméticas e a equação binomial xn=1 dá a solução para o problema da divisão do círculo e da construção do polígono regular de 17 lados de que se falou anteriormente. A congruência binomial reúne aritmética, álgebra, e geometria numa das sínteses mais importantes a que Gauss se dedicou e que ele alcançou aqui de uma maneira que tem poucos equivalentes na história da Matemática.
Astronomia
A Determinação da Órbita de Ceres
O interesse de Gauss pela astronomia foi despertado quando, no primeiro dia do novo século (1 de Janeiro de 1801), Piazzi, em Palermo, descobriu o primeiro asteróide, a que foi dado o nome de Ceres. Visto que não era possível fazer muitas observações do novo asteróide, levantou-se o problema do cálculo da órbita de um planeta a partir de um pequeno número de observações. Só assim os observadores saberiam para onde apontar os seus telescópios.
Gauss resolveu o problema completamente tendo sido conduzido a uma equação do oitavo grau.
Enquanto que as Disquisitiones arithmeticae
tornaram Gauss famoso entre os matemáticos,
a determinação da órbita
do asteróide Ceres fê-lo famoso
em todos os círculos académicos
do mundo.
No caso dos planeta podia-se dizer que a sua
órbita era uma elipse, isto é,
a sua excentricidade era um número
desconhecido entre zero e um. Mas, no caso
de Ceres os métodos conhecidos eram
inúteis.
Gauss já tinha trabalhado com questões astronómicas, por exemplo, com a teoria do movimento da lua e sentia-se agora atraído com este novo problema. Ele mostrava-se tão difícil que parecia ser necessário recorrer à sua tremenda virtuosidade computacional e à sua criativa imaginação. Decidiu então trabalhar em métodos mais úteis para determinar órbitas e rapidamente encontrou a sua primeira solução. Graças a este resultado, Ceres foi encontrado novamente durante o período de 25 de Novembro a 31 de Dezembro de 1801, quase exactamente no sítio que havia previsto.
Enquanto continuava a melhorar os seus métodos, Gauss calculou efemérides para novos asteróides à medida em que eles eram descobertos. Os seus cálculos para Vesta provocaram uma indisfarçada admiração em Olber (Wilhelm Olbers (1758-1840), um mais importantes astrónomos amadores de todos os tempos. Durante o dia exercia medicina, e à noite sentava-se no seu observatório privado, onde entre outras coisas, descobriu pelo menos seis cometas e dois asteróides. Este homem, que claramente necessitava de dormir muito pouco, tornou-se um dos amigos mais íntimos de Gauss.) Em apenas dez horas Gauss tinha calculado os elementos da órbita e comparado os seus valores teóricos com as diferentes observações dos novos asteróides.
Quando se tratava de órbitas parabólicas, os seus cálculos eram ainda mais rápidos. Gauss conseguia calcular a órbita de um cometa simplesmente numa hora, tarefa que tinha ocupado Euler, usando outros métodos, durante três dias. Dizia-se que tantos cálculos tinham levado Euler a cegar de uma das vistas. Gauss afirmou um tanto desapiedadamente: "Eu também teria cegado se tivesse calculado dessa maneira, durante três dias."
A Teoria do Movimento dos Corpos Celestes
Gauss publicou os seus novos métodos em 1809 sob o título Theoria motus corporum coelestium in sectionibus conicis solem ambientium (Teoria do movimento dos corpos celestes que se movem em torno do sol em secções cónicas), obra que constitui um trabalho clássico em astronomia teórica.
O seu trabalho teórico em astronomia terminou em 1817, mas Gauss continuou a ser um observador posicional, calculando e relatando os seus resultados até à sua morte. Auxiliado por estudantes e colegas, observava regularmente e estava envolvido em todos os detalhes relativos à instrumentação.
Casamento e Avanços Académicos
Em 1804 um novo observatório foi planeado em Göttingen. A 25 de Julho de 1807, Gauss foi nomeado Professor de Astronomia e director do observatório em Göttingen.
Em Novembro de 1807 Gauss mudou-se para Göttingen tendo trabalhado no velho observatório enquanto o novo edifício estava em construção. Permaneceu na posição oficial de Director do Observatório durante o resto da sua vida.
Mas não o fez sozinho...
Em 1803, havia conhecido Johanna Osthoff, a filha do dono de uma fábrica de curtumes em Braunschweig. Ela tinha nascido em 1780 e era filha única. Ficaram noivos no final de 1804. O casamento teve lugar a 9 de Outubro de 1805.
Em 1814 o novo observatório estava completo. As residências dos professores ficaram completas em 1816. Gauss e a sua família mudaram-se para a ala oeste, enquanto Harding vivia na ala este. Durante os anos seguintes, Gauss e Harding instalaram os instrumentos astronómicos.
A Morte do Duque. A morte da Mulher de Gauss.O seu segundo casamento.
A 14 de Outubro deu-se a batalha de Auerstädt na qual o Duque Ferdinand era comandante das tropas Prussianas e Saxónicas. Durante a batalha, o Duque foi atingido por uma bala de mosquete e morreu em Altona a 10 de Novembro de 1806. Significativo é o fato de o seu nome não ter ficado na História política mas, pelo apoio prestado a Gauss, ter encontrado lugar na história da Matemática.
Durante este período de agitação
política Gauss encontrou compensação
no seu trabalho e na sua família. Teve
três filhos: Joseph (1806); Wilhelmina
(1808); e por fim Ludwig (1809). Com a terceira
gravidez, Johanna esgotou as suas forças
e acabou por morrer a 11 de Outubro de 1809,
sendo seguida por Louis (Ludwig), cinco meses
mais tarde. Gauss entrou numa profunda solidão
da qual nunca mais conseguiu realmente sair.
No entanto, menos de um ano depois, a 27 de
Março de 1810, acabou por escrever
a sua segunda proposta de casamento. Esta
proposta foi dirigida à melhor amiga
da sua falecida mulher, Minna Waldeck. Gauss
casou com ela a 4 de Agosto de 1810.
Deste casamento nasceram dois filhos e uma
filha: Eugene (1811), Wilhelm (1813) e Therese
(1816). Contudo Minna raramente estava bem
ou feliz: para além da doença
que a afligia, sofria por Gauss dominar as
suas filhas e discutir com os seus filhos
mais novos que acabaram por imigrar para os
Estados Unidos da América.
Gauss nunca conseguiu ter uma vida familiar
tranquila até que a sua filha mais
nova, Therese, tomou conta da família,
depois da morte da sua mãe (em 1831)
e se tornou a sua companhia durante os seus
últimos vinte e quatro anos de vida.
Erros Observáveis e o Cálculo Das Probabilidades
O grande interesse de Gauss em Astronomia, e o seu tardio interesse em geodesia, levaram-no a procurar métodos racionais para determinar a magnitude dos erros observáveis.
Ainda hoje a teoria dos erros observáveis é ensinada quase exatamente na mesma forma que Gauss a criou. Dado que a Astronomia assumiu uma posição dominante entre as ciências experimentais durante o período que foi de 1600 a 1700 é natural que a teoria dos erros observáveis tenha tido o seu primeiro desenvolvimento em astronomia.
O Método dos Mínimos quadrados.
A primeira publicação de Gauss do método dos mínimos quadrados apareceu em 1809 no final do seu Theoria motus. Em 1823 Gauss publicou o seu grande trabalho Theoria combinationis observationum erroribus minimus obnoxiae (A Teoria para a combinação de observações, que estão ligadas com os mínimos erros possíveis).
Trata-se de uma apresentação sistemática e generalizada da sua recente teoria de erros observáveis. Gauss desenvolve aí o método dos mínimos quadrados enquanto a mais adequada de combinar observações, independentemente de qualquer lei hipotética relativa à probabilidade de erro.
A Lei da Distribuição Normal. A Curva dos Erros.
A famosa lei da distribuição
de Gauss, com várias aplicações,
foi publicada na terceira secção
do livro Theoria motus.
Gauss fez série de suposições
gerais sobre as observações
e os erros observáveis e complementou-os
com uma suposição puramente
matemática. Depois, de uma forma muito
simples, foi capaz de obter a equação
da curva que correspondia aos seus resultados
empíricos. Essa curva era a Curva de
Gauss
O gráfico de assemelha-se a um sino e às vezes é chamado uma curva em forma de sino. Se o coeficiente da precisão é grande, então a curva é íngreme e as observações caem próximo da média aritmética. Mas se for pequena, a curva é plana, isto é, a distribuição é mais generalizada.
Gauss também fez cálculos acerca de limites de erros prováveis para uma série particular de observações da mesma quantidade. O resultado mais importante aqui é que o erro médio da média aritmética é inversamente perpendicular à raiz quadrada do número de observações; noutras palavras, a ocorrência provável da média cresce com a raiz quadrada do número de observações.
Gauss descobriu também o Teorema do Integral de Cauchy para funções analíticas, mas não publicou essa descoberta.
Geodesia
Em 1817, Gauss estava preparado para trabalhar em relação à Geodesia que seria a sua preocupação durante os próximos oito anos e um peso nos seguintes trinta anos.
Desde a sua chegada a Göttingen, Gauss estava preocupado com a exactidão da localização do observatório e, em 1812, o seu interesse em problemas mais gerais foi estimulado durante uma visita ao Observatório de Seeberg. Começou então a discutir com Schumacher a possibilidade de prolongar até Hannover o último prolongamento da Dinamarca. E Gauss tinha muitos motivos para este projecto. Ele envolvia problemas matemáticos interessantes que abriam um novo campo para as suas habilidades calculatórias e permitiam complementar a sua astronomia posicional. Competindo com os esforços franceses para calcular o comprimento do arco de um grau no meridiano, esta situação oferecia-lhe uma oportunidade de fazer alguma coisa útil para a humanidade, providenciando uma fuga aos aborrecimentos do seu trabalho e aois problemas familiares. A última era uma razão trivial, dado que Gauss tinha responsabilidades familiares acrescidas para enfrentar um salário que permaneceria fixo desde 1807 até 1824.
Só em 1820 a Triangulação
de Hannover foi oficialmente aprovada, mas
já em 1818 Gauss havia começado
um árduo programa de verão no
qual, supervisionando no terreno, tentava
recolher dados que não tinha sido possível
obter durante o inverno.
Atormentado pelo deficiente arejamento das
instalações em que se encontrava,
pelas desconfortáveis condições
de vida, pelo mau tempo, pelos funcionários
pouco cooperativos, pelos acidentes, pela
saúde precária e pela inadequada
assistência e suporte financeiro, Gauss
fez o trabalho de campo quase sempre sozinho
ou com uma ajuda mínima durante oito
anos. Foi, sem dúvida, uma verdadeira
prova de persistência.
Depois de 1825, restringiu a si a supervisão
e a calculação necessária
ao acabamento da triangulação
de Hannover em 1947. Quando tal aconteceu,
havia manejado milhões de números
sem qualquer assistência.
Um dos instrumentos que resultou do seu trabalho
de campo foi o invento do heliotrópio,
um instrumento que permitia reflectir os raios
solares numa direcção medida.
Motivado pela insatisfação quanto
aos parcos métodos existentes para
observar pontos distantes, Gauss decidiu usar
luz do sol reflectida. Depois de trabalhar
em teoria óptica, projectou o instrumento.
O primeiro modelo foi construído em
1821. O resultado foi bem sucedido na prática,
tendo o instrumento alcançado o brilho
da magnitude de uma primeira estrela à
distância de 24.14 km.
***
O percurso vitorioso de Gauss viria a terminar
a 23 de Fevereiro de 1855, dia em que faleceu
enquanto dormia. Apesar da sua morte, o seu
trabalho e as suas poderosas contribuições
para a Matemática estão, ainda
hoje, mais vivas do que nunca. Num olhar pela
história da Matemática e da
Astronomia será impossível não
reconhecer o quanto o trabalho realizado por
Gauss permitiu que estas duas ciências
progredissem e tivessem o grau de rigor e
precisão que hoje as caracterizam...