D.
João VI
João Maria José Francisco Xavier
de Paula Luís António Domingos
Rafael - o futuro D. João VI - nasceu
em 13 de maio de 1767, no Palácio Real
da Ajuda, nas cercanias de Lisboa, e morreu
em 10 de março de 1826, no Paço
da Bemposta, na mesma cidade,com quase 59 anos
de idade.
Como
príncipe ou rei, nos 34 anos de seu governo
(1792-1826), D. João foi personagem da
história luso-brasileira em diversos
momentos significativos. Ele participou de vários
acontecimentos, freqüentemente analisados
pela historiografia como: a transferência
da Corte portuguesa para o Brasil e a abertura
dos portos brasileiros às nações
amigas (1808); a assinatura dos tratados de
comércio com a Inglaterra (1810); a elevação
do Brasil a Reino Unido de Portugal e Algarves
(1815); a repressão militar à
Revolta Pernambucana (1817); o retorno da família
real a Portugal (1821); o reconhecimento da
independência política do Brasil
(1825), proclamada em 1822, por seu filho, D.
Pedro I.
Para
efeito de análise, dividimos a vida de
D. João em três grandes fases:
A
primeira desenvolve-se em Portugal, entre 1767
e 1807, e é marcada por episódios
como seu casamento com a infanta da Espanha,
D. Carlota Joaquina (8 de maio de 1785) e pela
morte de seu irmão primogênito,
D. José - tornando D. João o herdeiro
da Coroa com o título de Príncipe
do Brasil. Em função da doença
mental de sua mãe, D. Maria I, ele assumiu
a regência em nome da rainha em 10 de
fevereiro de 1792. Posteriormente, em 13 de
julho de 1799, tornou-se príncipe-regente
em nome próprio, um ano depois do nascimento
de seu filho Pedro de Alcântara (mais
tarde Pedro I do Brasil e Pedro IV de Portugal).
Ainda nesta primeira fase de sua vida, nasceu
o filho infante D. Miguel (em 26 de outubro
de 1802).Em 29 de novembro de 1807, o exército
francês, comandado por Junot, invadiu
Portugal; quase simultaneamente à retirada
da Corte lusa para o Brasil, indo D. João
e D Maria I a bordo da nau Príncipe Real.
A
segunda fase da periodização corresponde
à permanência da Corte no Brasil
(1808-1821), quando a ex-colônia brasileira
se converteu em sede da monarquia. Em janeiro
de 1808, D. João aportou na Bahia, onde
assinou uma Carta Régia abrindo os portos
brasileiros ao comércio com as nações
amigas. No mês seguinte, ele e sua Corte
partiram em direção ao Rio de
Janeiro, aonde chegaram a 7 de março.
Na nova capital, o príncipe-regente tomou
várias medidas: revogou a proibição
das manufaturas no Brasil (1º de abril);
criou o Desembargo do Paço e a Mesa da
Consciência e Ordens (22 de abril), a
Casa da Suplicação do Brasil,
a Intendência Geral da Polícia
(10 de maio), a Impressão Régia
(13 de maio), a Real Junta do Comércio,
Agricultura, Fábricas e Navegação
(23 de agosto) e o Banco do Brasil (12 de outubro).
Os anos seguintes de sua permanência no
Brasil foram marcados pela assinatura dos tratados
com a Grã-Bretanha (de Amizade e Aliança
e de Comércio e Navegação,
em 19 de fevereiro de 1810) e pela elevação
do Brasil a Reino Unido a Portugal e Algarves
(16 de dezembro de 1815).
Com
a morte da rainha, em 20 de março de
1816, sucedeu-lhe com o título de D.
João VI, sendo coroado no Rio de Janeiro
em 6 de fevereiro de 1818, como o 27º rei
de Portugal e o 1º do Reino Unido. No campo
militar, seu governo enfrentou uma revolta em
Pernambuco em 1817, determinou a ocupação
da Guiana Francesa em 1808 (abandonada em 1817)
e anexou a Cisplatina em 1821, em represália
ao auxílio dado pelos espanhóis
à invasão francesa de Portugal.
Um
movimento iniciado no Porto, em 1820, levou
à promulgação de um decreto
determinando o regresso de D. Pedro a Portugal
e convocando os procuradores eleitos pelas Câmaras
do Brasil, Açores, Madeira e Cabo Verde
para uma Junta de Cortes. A adesão das
tropas do Reino ao movimento levou D. João
VI a prestar juramento à futura Constituição
portuguesa em fevereiro de 1821, pouco antes
da nomeação de D. Pedro como regente
do Brasil. Em 26 de abril de 1821, D. João
e sua Corte deixam o Brasil, retornando a Portugal.
Por
fim, a terceira fase (1821-1826) refere-se ao
regresso de D. João VI a Portugal, sob
a exigência do constitucionalismo portuense,
e inclui episódios como a promulgação
da Constituição portuguesa (23
de setembro de 1822), o enfrentamento das sublevações
encabeçadas por D. Miguel (Vilafrancada,
em 1823, e Abrilada, em abril de 1824) e o reconhecimento
da independência política do Brasil
(1825).
Objeto
de estudos de portugueses e brasileiros, o período
joanino se presta a análises comparativas
das interpretações de diversos
historiadores, construídas em diferentes
perspectivas. Vejamos um exemplo dessas diferenças.
Na
obra Evolução política
do Brasil (1ª ed.: 1933), o historiador
brasileiro Caio Prado Júnior observou
que, se os marcos cronológicos não
se estribassem em aspectos externos e formais,
a independência brasileira poderia ser
assinalada pela transferência da Corte
portuguesa para o Brasil, em 1808. Na análise
de Caio Prado, ao instalar no Brasil a sede
da monarquia e ao tomar medidas de grande impacto
político e econômico (como a abertura
dos portos), D. João aboliu efetivamente
o regime colonial. E mais: promoveu uma inversão
de papéis entre Brasil e Portugal, em
que a antiga colônia transformava-se em
sede do governo metropolitano.
Estabelecendo
no Brasil a sede da monarquia, o Regente aboliu
ipso facto ("ípso
fácto", significa "por esse
próprio fato", "por isso mesmo";
"exatamente por isso". É usado
quando vamos anunciar uma conseqüência
obrigatória , um resultado inevitável
de um fato mencionado) o
regime de colônia em que o país
até então vivera. Todos os caracterres
de tal regime desapareceram, restando apenas
a circunstância de continuar à
sua frente um governo estranho. São abolidas,
uma atrás da outra, as velhas engrenagens
da administração colonial, e substituídas
por outras já de uma nação
soberana. Caem as restrições econômicas
e passam para um primeiro plano das cogitações
políticas do governo os interesses do
país. São esses os efeitos diretos
e imediatos da chegada da Corte. Naquele mesmo
ano de 1808 são adotadas mais ou menos
todas as medidas que mesmo um governo propriamente
nacional não poderia ultrapassar. (PRADO
Jr., 1979, p. 43.)
Em
vez de uma perspectiva de "emancipação
brasileira", os efeitos da instalação
da Corte joanina no Rio de Janeiro podem ser
focalizados pelo ângulo da crise que provocou
em Portugal. Nesse sentido, o historiador português
José Hermano Saraiva (2001, p. 274) sintetizou:
O
Brasil constituía então uma base
essencial da economia portuguesa. A nossa exportação
era quase toda (exceptuando o vinho do Porto)
canalizada para os portos brasileiros; a nossa
importação vinha quase toda do
Brasil; as matérias-primas tropicais
faziam escala em Lisboa e daqui eram reexportadas
para o exterior. Todo comércio dependia
desse sistema e desse tráfico vivia a
marinha mercante. A emancipação
econômica do Brasil teve portanto conseqüências
graves na economia portuguesa. A antiga colônia
passara, em poucos anos, de fonte de rendimento
a fonte de despesa. Muitos dos nobres instalados
na corte do Rio viviam à custa dos bens
que possuíam em Portugal.
Assim,
a política joanina de romper antigas
subordinações do Brasil em relação
à Metrópole provocou crises em
Portugal. Em razão das contradições
entre Colônia e Metrópole, as medidas
que "libertavam" o Brasil desse sistema
de exploração colonial "sufocavam",
em contrapartida, Portugal.
Gilberto
Cotrim. Professor de História
pela USP. Mestre em Educação e
História da Cultura pela Universidade
Mackenzie. Autor de História Global pela
Editora Saraiva.
======================================
A
CORTE DE D. JOÃO VI NO BRASIL
Com
a chegada de D. João VI, que havia fugido
da invasão napoleônica na Península
Ibérica (1807), o Rio de Janeiro entrou
em ebulição. Várias transformações
marcaram o cenário político-social
da cidade: o Decreto da Abertura dos Portos
às Nações Amigas transformou
o porto do Rio num importante centro financeiro-comercial;
o crescimento populacional foi outro fator marcante,
devido ao grande número de nobres e funcionários
da corte portuguesa que formavam a comitiva
do rei; a criação do Banco do
Brasil e de novas instituições
administrativas, trazendo para o Rio de Janeiro
os ares da metrópole. Os hábitos
culturais se modificaram, pois se fazia necessário
satisfazer a demanda de uma aristocracia que
valorizava a cultura européia.
D.
João VI encontrou uma cidade pobre, sem
planejamento urbano e saneamento básico,
com ruas estreitas, sujas e apinhadas de escravos,
ambulantes e "bugres", escravos responsáveis
pelo despejo de dejetos na baía. O Paço
Imperial, residência oficial do Vice-Rei,
possuía uma arquitetura pobre, sem adornos,
ainda no estilo colonial "porta e janela",
sem mobiliário adequado para receber
um monarca e, sobretudo, muito pequeno para
abrigar a comitiva real. Outras residências
serviram de abrigo para a corte: o Convento
das Carmelitas, onde ficou D. Maria I; a Casa
do Trem (atual Museu Histórico Nacional);
o prédio da Cadeia, vizinho do Paço,
que virou residência de aristocratas.
Não satisfeito, D. João decretou
que as melhores casas da cidade fossem cedidas
para os nobres que ainda não tinham moradia.
Cada casa escolhida pelos oficiais do rei deveria
ser desocupada imediatamente, sendo a porta
carimbada com as iniciais P.R. (Príncipe
Regente), que, no humor nativo, logo se transformou
em "Ponha-se na rua".
Durante
os treze anos de sua estadia no Brasil o regente
português criou várias instituições
culturais, como a Biblioteca Nacional, o Jardim
Botânico, o Real Gabinete Português
de Leitura, o Teatro São João
(atual Teatro João Caetano), a Gazeta
do Rio de Janeiro (sob censura régia),
a Imprensa Nacional, o Museu Nacional, a Escola
Real de Ciências, Artes e Ofícios.
Outras medidas que deram grande impulso à
cultura foram a reorganização
da Capela Real e a vinda da Missão Artística
Francesa (1816), que trouxe ao Brasil nomes
como Joachim Lebreton (pintor), Nicolay Antoine
Taunay (pintor), Auguste Marie Taunay (escultor),
Jean-Baptiste Debret (pintor), Augusto Henrique
Vitorio Grandjean de Montigny (arquiteto), Sigismund
Neukomm (compositor, organista e mestre-de-capela).
Fonte:
Biblioteca Nacional
| Vídeo: YouTube
==================================
Leia
mais sobre o assunto clicando
aqui
==============================