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Diferente dos franceses, os jovens brasileiros são conformistas (18/4/2006 - Aldrin Willy)

O turbilhão de escândalos de corrupção que aflora diariamente vem deixando a juventude ainda mais enojada do processo político. Mesmo assim, não há reações organizadas, como na França, por parte dos jovens, especialmente universitários.

Os personagens são semelhantes, as situações também. Mas as cenas são paradoxais: França e Brasil. No país europeu, jovens tomaram as ruas em protesto contra o governo que queria impor uma lei do primeiro emprego que, aprovada, mais geraria desemprego. Na República tupiniquim, a corja dos corruptos vem promovendo um espetáculo nacional em tributo à impunidade, com direito a danças e tudo o mais. Aqui, entretanto, a juventude cala e consente.

Por que na França a juventude do país, representada em especial pelos universitários, se mobilizou contra aqueles que iam contra seus interesses? E no Brasil por que o mesmo não ocorre, diante dos inacabáveis escândalos de corrupção que afloram diariamente pelo país afora? Imprensa Popular foi atrás de estudantes e estudiosos para saber deles a resposta.

DESILUSÃO POLÍTICA

A jovem estudante de Jornalismo Iule Carla Pinheiro Vargas, de 23 anos, não esconde seu descontentamento com o atual estado de coisas. “Eu me iludi achando que haveria uma intervenção federal”, confessa. “Acho um absurdo que depois de tanta ilegalidade política eles [políticos] estarem atuando como se nada tivesse acontecido”.

Entre os colegas, Iule é das estudantes mais engajadas: está sempre metida em protestos, mobilizações ou campanhas educativas. Mas mesmo ela hoje admite estar frustrada com o caminhar das coisas após os violentos protestos de 2005, na época em que estourou o escândalo das propinas envolvendo o governador e parte dos deputados estaduais.

— Depois de a gente ter ido às ruas, pintado a cara, ser agredido, nada foi feito. Chega a um ponto em que o acadêmico, o jovem, se desacredita da lei, da política e acaba ficando adormecido para o engajamento político.

INDIFERENÇA

Na opinião da também acadêmica de Jornalismo Beatriz Bortolete, de 20 anos, a indiferença dos jovens pela política é fruto da alienação. “Os jovens não procuram mais saber como funciona a política, o Brasil, e o que foi que aconteceu para chegar até aqui”, afirma.

De acordo com Beatriz, o jovem fica preso a história passada nas salas de aula e “esquece que ele faz parte do passado, do futuro e do presente do Brasil”. O que – continua – contribui “para tudo que está acontecendo, tanto para o lado bom quanto para o ruim”.

E dessa maneira o jovem vai se alienando mais e mais. “Ficando com as coisas supérfluas da vida e deixando de lado aquelas que realmente importam”, conclui a estudante.

CONTEXTO HISTÓRICO

Para o professor de Filosofia da UNIR (Universidade Federal de Rondônia) Adilson Siqueira de Andrade, mestre em Antropologia, o comportamento do jovem brasileiro precisa ser analisado dentro do contexto histórico.

De acordo com o estudioso, é inviável comparar o alto grau de mobilização do jovem francês com a inércia do brasileiro porque tais posturas têm diferentes contextos históricos.

No caso do jovem europeu, Andrade afirma que esse comportamento faz parte da postura preservada pelo povo francês desde a Revolução Francesa (1789-1799). A juventude brasileira, por sua vez, vem de outro contexto histórico, explica o professor.

— A década de 80 foi marcada por muitas lutas e movimentos, frutos dessa questão histórica. O povo estava precisando reafirmar posições. Nas décadas de 90 a 2000, entrou no cenário um novo ente: as ONGs (Organizações Não-Governamentais). Apoiadas pelo Banco Mundial, elas vêm na tentativa de assumir uma posição que seria do sindicato e dos movimentos sociais. Só que as ONGs não são únicas também. Há ONGs marxistas e ONGs neo-liberais, prevalecendo as neo-liberais. E, nesse sentido, eu vejo que os sindicatos foram se aplastando, os movimentos sociais foram se desgastando.

Por isso, entende Adilson, dizer que o jovem brasileiro é tolerante com a corrupção não é correto, visto que ele surge em meio a esse desgaste geral dos movimentos sociais. Além disso, argumenta, “estamos numa sociedade capitalista onde somos pulverizados com ideologias que tentam implantar a felicidade do ponto de vista do consumo”.

“A juventude não é alienada por si. Ela é o resultado de uma cultura. Se a cultura é capitalista ela vai tender a pensar como capitalista”, assevera o professor.

RESISTÊNCIA ACADÊMICA

Outro problema, segundo Andrade, é a fragilização imposta pelo governo aos centros universitários, redutos naturais de resistência a tais ideologias alienantes.

“Uma forma de tirar poder das universidades é não investindo nelas”, sentencia. “O governo Lula é massacrante do ponto de vista do investimento. Não dá para entender um governo que fala em desenvolvimento sem investir na prática nas universidades”.

Mesmo com a falta de recursos, o professor Adilson Siqueira acredita que a universidade é de todas as entidades públicas a mais crítica.

MOMENTO ÚNICO

Contra tudo o que indicam as aparências, Andrade afirma que estamos vivendo um momento de retomada dos movimentos sociais.

— Estamos na encruzilhada do labirinto. E nessa encruzilhada ninguém tem certeza. É necessário muito debate. Quando você olhar e ver os líderes dizendo que “é por aqui”, desconfie. Porque ninguém tem certeza de nada. A transformação da sociedade só se dá com a sociedade civil organizada. Não vamos esperar que um líder resolva isso. Não existe um líder. Existe uma comunidade que dentre a ela vai sair o seu líder, não com um projeto espontâneo, mas com um trabalhado.

(Publicado na edição nº 79, de 11 a 20 de abril de 2006)

Fonte: Imprensa Popular

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