Aprender
a ser
Sônia
Maria Ruella
Centro Educacional Waldorf Alecrim Dourado
Esta é uma versão revisada; o original
foi publicado na revista Homeopatia
& Cia, Ano 2, No. 6,
março 2004, p. 6; e pode ser obtido
no site da revista
Todo
educador, ao educar, deve sempre
ter em mente um fato fundamental:
de que a criança não deve ser educada
apenas para aprender, mas também,
para, ao mesmo tempo, crescer e
completar sua maturação orgânica
de forma equilibrada. O educador
deve ajudá-la a desempenhar essas
duas funções.
Rudolf
Steiner atribuiu essa importante
tarefa ao educador, fundando em
1919, em Stuttgart, na Alemanha,
a primeira escola que deu início
à Pedagogia Waldorf, baseada em
um conhecimento aprofundado da natureza
humana.
De
acordo com a sua concepção, o ser
humano é um ser físico, anímico
e espiritual, cujo desenvolvimento
transcorre em fases, cada uma com
necessidades intrínsecas. Durante
os primeiros sete anos de vida a
criança vai completando (metamorfoseando)
os seus órgãos vitais, até que atinjam
a sua forma definitiva. Nesse 1º
Setênio ela entrega-se, desprotegida
e confiante, ao cuidado de terceiros,
de quem vai recebendo amor e carinho,
mas, também, modelos e orientações
de vida. Nesse período, a criança
aprende por imitação, não só do
mundo exterior (gestos de todos
os dias, atividades básicas de higiene,
alimentação, vestuário, caminhar,
falar, etc), mas também do mundo
interior (imitação da qualidade
dos estados de alma do adulto com
quem convive e com quem aprende
a pensar). Todo o meio que envolve
a criança está em comunicação com
a alma infantil, que se entrega
plena de confiança. Todas as vivências
- e as suas qualidades - penetram
na criança atuando sobre o processo
de metamorfose dos seus órgãos.
É nesta fase que se desenvolve o
querer, que se manifesta
por meio das ações. De fato, toda
criança pequena, em uma atividade
sadia, é um ser de ação. Muitas
vezes, determinadas emoções vividas
nesse período manifestam-se mais
tarde sob a forma de doenças crônicas.
Se, porém, o ambiente em que cresceu
foi saudável, então é mais provável
que venha a dispor de uma constituição
orgânica sã. É evidente que muitos
outros fatores podem influenciar
ou mesmo determinar estados de debilidade
física, mas isso não invalida, aliás
reforça, a necessidade de se proporcionar
à criança até os sete anos uma atmosfera
familiar e social (jardim-de-infância)
que lhe permita completar a formação
saudável dos seus órgãos, base de
toda a sua vida. Para isso é necessário
que todos os sentidos sejam estimulados
naturalmente, pelo que se deve cuidar
das qualidades do som, da cor, dos
materiais, da alimentação, do calor.
Esse cuidado dar-lhe-á o alicerce
para o futuro, fortalecendo-lhe
a vontade. O dia-a-dia de um jardim
de infância, reproduzindo tanto
quanto possível o de uma grande
família, em sua casa, com o seu
ritmo natural de trabalhar e brincar,
com as imagens trazidas pelos contos
de fadas, com elementos da natureza,
constitui um ambiente propício ao
desenvolvimento feliz e saudável
da criança.
Quando
é atingida a maturidade para aprender
a ler e escrever, a maioria das
forças vitais que se empenhavam
no desenvolvimento de seu organismo
são liberadas e ficam disponíveis
para essas aquisições e para outras
sistematizadas. A imitação, embora
ainda atuante, vai deixando de ser
relevante e o que se torna agora
importante é o desejo de admirar,
de venerar alguém que lhe revele
o mundo exterior. A criança já não
se entrega incondicionalmente ao
mundo como antes.
Agora,
ela recolhe-se freqüentemente em
seu mundo interior e precisa de
um mediador em quem possa confiar,
como antes confiou no meio que a
envolvia. Esse mediador para quem
a criança eleva todo o seu ser interior
num ato de veneração é o professor
- aquele que traz a beleza do mundo
até ela. Cabe ao professor fazer
despertar no aluno o sentido artístico,
praticando-o na globalidade das
aprendizagens necessárias. E, uma
vez mais, não se trata aqui apenas
de atividades exteriores: o pintar,
o modelar, o fazer música, preenchem-se
de uma atitude interior de olhar,
ouvir, ver, escutar e de sentir.
É
nesta fase que se desenvolve o sentir,
por meio da beleza do som da palavra
e da frase; da beleza das letras
do alfabeto (apresentadas artisticamente)
e da beleza na verdade dos números;
da beleza do inseto, da árvore,
da chuva e da areia. Por amor ao
professor, pelo que de belo ele
lhe trás do mundo exterior, o aluno
esforça-se em fazer bem tudo o que
lhe é proposto. Uma vez mais, é
aqui necessário criar um ambiente
- a escola - que não contradiga
a sensibilidade que desperta e se
desenvolve. Os contos, as lendas
e fábulas, trechos do Antigo Testamento,
mitos ou sagas de outros povos e
biografias significativas, dão-lhe
a imagem do ser humano e do seu
percurso, por entre o bem e o mal.
No
3º setênio o raciocínio, que já
vinha desenvolvendo-se, ganha novas
dimensões e o jovem entra na fase
da formulação de juízos fundamentados.
Ele dispõe agora das forças do pensar
para penetrar a verdade do mundo
com as suas capacidades intelectuais
e manuais: ciências naturais e sociais,
filosofia, artes, tecnologias. Procura
junto dos especialistas o porquê
dos fenômenos e das suas leis, quer
naturais, quer sociais. O jovem
anseia por intervir nesse mundo
real e é isso que a escola deve
propiciar-lhe.
Como
vimos, a educação deve respeitar
essas três forças naturais do ser
humano, favorecendo seu desenvolvimento
equilibrado e sadio: querer, sentir
e pensar devem desenvolver-se equilibradamente
nos três primeiros setênios da vida
do ser humano. Só dessa forma poderemos
garantir uma vida saudável e feliz
para o indivíduo que queremos educar.
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